Fervor revolucionário

O presidente da Câmara, deputado Aldo Rebelo, disse que agora que atingimos a estabilidade econômica o crescimento virá. Eu não levo o deputado a sério, na verdade acho que ninguém leva, nem ele mesmo parece acreditar no que diz. A afirmação serviu para que eu viajasse no tempo, guarda semelhanças com os programas que a Rádio de Pequim transmitia no final da década de 1960. Como eram em português eu os ouvia em ondas curtas, na Ilhabela, durante as férias. Lembro-me bem da edificante história de uma jovem pastora que ao ver uma de suas ovelhas desgarrar foi buscá-la sem notar o perigo que corria. Quando a encontrou a noite caia rapidamente. Sabendo que a região era infestada de lobos, a jovem assustada entrou em uma caverna com a ovelhinha nos braços. Durante a noite a temperatura baixou para perto de ponto de congelamento. Para não morrer a pastora abriu o livrinho vermelho do camarada Mao e o leu em voz alta. Os ensinamentos do pai de todos, do redentor da raça humana, do iluminado camarada libertador fizeram com que ela e a ovelhinha suportassem o frio e resistissem. Acabaram sendo consideradas heroínas revolucionárias. A jovem ganhou um disco de Violeta Parra e a ovelhinha teve a honra de ser servida em churrasco ao camarada Mao. Isso aconteceu na época da Revolução Cultural. Desde esse dia nunca mais sintonizei tal rádio, mudei para a BBC que tocava rock. Quarenta anos depois escuto histórias parecidas todos os dias. Apenas o camarada mudou, antes era Mao Tse-tung, agora é outro. Felizmente não haverá livrinho vermelho.

Sidney Borges

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