Retratos da genealogia: as marcas dum desparecimento “Maxilimian desaparece da crônica familiar e do mundo, mesmo porque não há vestígios de sua morte – nenhuma lápide, nenhuma cruz” Márcia Denser Maximilian Hehl (1) (que não se chamava nem Maximilian nem Hehl), meu tatatataravô, tinha 22 anos quando deixou Berlim por volta de 1855 zarpando pela cidade livre de Dantzig. Jovem, louro e solitário, uma capa cinza de oleado sobre os ombros, veias azuis inchadas sob a fina pele branca dos punhos agarrados às cordas do velame do cargueiro em cujo porão depositara os dois caixotes que eram tudo o que possuía o rapaz que não precisava de coisa alguma além da sua, a sua alma furiosa. Porque a solidão não era o bastante, nem o desamparo, a juventude, a indiferença pela paisagem que engolia, a infinita trilha das águas da qual parecia estar à frente, ele não a via, apenas engolia com feroz urgência obstinada, tão alheio à aventura da viagem quanto ao seu destino, indiferente ao cotidiano f...