Celebridades

Os meninos de Madonna

João Pereira Coutinho (original aqui)
Madonna foi às compras e um tribunal não deixou. Aconteceu no Maláui. Em 2006, a cantora pop mais famosa do mundo proletário aterrou em África, praticamente raptou financeiramente uma criança e depois zarpou para Ocidente com o troféu nas mãos.


Agora, a operação não teve igual sucesso e Madonna não conseguiu fazer o par da coleção. Um juiz decidiu que, sem residência mínima no país por período de 18 a 24 meses, Madonna tem que procurar crianças em outro lugar. Onde?


Uma sugestão: em Portugal, por exemplo. Eu próprio não me importaria de ser adotado por Madonna. As vantagens são evidentes: crescido e alfabetizado, sem necessidade de fraldas (por enquanto), seria uma criança adorável, capaz de tomar o leite a horas certas e sem necessidade de presença maternal durante os concertos da diva.

Aliás, agradeceria até que a diva me deixasse regularmente numa mansão qualquer, de preferência em Londres ou Nova York, entregue aos cuidados de duas ou três baby-sitters que me dessem colo e carinho em momentos de inevitável carência infantil.

Madonna tem outras ideias e é provável que, em breve, volte ao ataque. Condenável?A doutrina, como sempre, divide-se. Alguns críticos, com impecável raciocínio econômico, dizem coisas sensatas que seria crueldade não escutar.

Primeiro: o Maláui é pobre. Segundo: Madonna é rica. Terceiro: uma criança pobre em família rica é uma benesse para a criança.

O raciocínio, temo bem, não é claro. Para começar, ainda está por provar que a pobreza material africana é pior do que a pobreza mental de Madonna. E, para terminar, o cálculo puramente econômico, se levado ao limite, acabaria por privar África, e não apenas o Maláui, de qualquer futuro demográfico e humano. África seria apenas o shopping center das celebridades que, depois das compras feitas, deixariam para trás uma lixeira de gente velha, doente. E pobre.

Se Madonna quer "ajudar" as crianças de África, talvez o primeiro passo seja parar de exibir os troféus do continente negro perante as lentes sentimentais do mundo.


O segundo passo, mais caridoso e incomparavelmente mais barato, resume-se em palavra simples: filatelia.

P.S. - Sou informado pela redação da Folha Online que incontáveis leitores têm protestado com meu alegado erro nesse artigo. Onde está escrito "filatelia", os leitores acreditam que minha real intenção era escrever "filantropia". Lamento desiludir as almas beneméritas dos leitores: minha intenção era "filatelia" por motivos que eu julgava óbvios. Entre colecionar crianças ou colecionar selos, eu penso que é mais simpático, mais decente e mais barato colecionar selos. "Filantropia" é outra coisa: por exemplo, gastar tempo e dinheiro explicando aos leitores o conceito de ironia.

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