Opinião

Na luta política golpes baixos valem mais?

José Nêumanne
Diziam os antigos que a política é a arte de engolir sapos. Não deve ser fácil fazê-lo, mas na certa mais habilidade se exigirá de quem cospe para cima e não quer ser atingido pela própria cusparada. O deputado Eduardo Paes, ex-favorito à prefeitura da segunda maior cidade do País, a antigamente tida como maravilhosa São Sebastião do Rio de Janeiro, é a mais recente vítima desta lei inexorável da Física, dita da gravidade, que Isaac Newton descreveu, segundo a lenda, após a queda de uma maçã sobre sua cabeça. Ele era secretário-geral do PSDB, principal partido da oposição, quando os meios de comunicação se ocupavam quase exclusivamente do escândalo do "mensalão". E, inflamado pelo calor dos holofotes, apressou-se a convocar o amado filho de Sua Majestade, o nunca antes tão popular presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a depor.


Mas, como deviam também saber os mais jovens, pois os provectos o afirmam faz tempo, o mundo dá muitas voltas e a noite que prenuncia o dia - e vice-versa - também aconselha a prudência como única atitude para a qual há a garantia de que represálias não virão. À época da turbulência provocada pela denúncia do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), o tucanato, em cujo ninho se aninhava o rapaz, se alvoroçou com a possibilidade de sangrar o peru às vésperas da eleição, sem imaginar que para isso teria de desinfetar as próprias vísceras. Tido como derrotado antes da hora, o fenômeno de popularidade Lula da Silva deu a volta por cima e enterrou os sonhos tucanos de voltar a galgar as rampas palacianas, como nos velhos tempos. Treinado nas manhas e mumunhas da politicagem nacional e conhecedor da inabilidade tucana para ler os desígnios do destino, Paes pulou de galho e se abrigou à sombra da frondosa árvore peemedebista, sob as bênçãos do governador fluminense, Sérgio Cabral, que fora ungido pela graça de El Rey todo-poderoso. Dali partiu para disputar a prefeitura da ex-Cidade Maravilhosa e, para gozar os benefícios da fama do Supremo, mandou-lhe uma carta, extensiva à digna consorte, pedindo perdão pelo que antes dissera de seu pimpolho.

Nada houve, desde as denúncias açodadas de Sua Excelência, que o levasse a voltar atrás, da forma humilhada como o fez, nas acusações a Sua Alteza. O que o fez abjurar o que antes afirmara com tanta convicção não foi a presunção da inocência do príncipe nem o reconhecimento da própria precipitação, mas o peso a que submeteu sua coluna o projeto de se alçar a tão alto cargo, carga, pelo visto, superior à da própria palavra - e de sua biografia. Na disputa apertada que se prenuncia pelo voto carioca neste turno decisivo, importa é conseguir a bênção do Sumo Pontífice. A coerência, como dizia o velho Chatô, patrono da malandragem nacional, é a virtude dos imbecis. É de duvidar que, mesmo que ele arregaçasse as mangas da camisa e partisse para o corpo-a-corpo da campanha, o que não fará, a popularidade do Maior Magistrado, sozinha, vencesse Fernando Gabeira (PV). Mas, por mais humilhante que seja, a retratação pesa menos sobre as vértebras do candidato oficial que o risco de deixar escaparem alguns votos dos receptadores da Bolsa-Família. Seria a política um tipo de vale-tudo em que golpes baixos valem mais pontos?
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