Lula: o preferido dos banqueiros

Governo em conserva

Freio no rendimento da poupança é medida pífia, que atende aos bancos; pequeno poupador continua discriminado

Editorial da Folha de S.Paulo, dia 08 de março de 2007
A faceta conservadora do governo Luiz Inácio Lula da Silva vai se acentuando. A inaptidão para grandes projetos -não raro associada à indolência - e a opção pelos ajustes acomodatícios ao "statu quo" se revelaram mais uma vez na medida destinada a reduzir a rentabilidade da caderneta de poupança, anunciada anteontem.
A aplicação tradicional e popular ganha atratividade com a queda dos juros na economia. A caderneta -ao contrário do ocorrido com os investimentos em renda fixa e, em especial, os fundos DI, indexados à taxa Selic - não perdeu rentabilidade. Com remuneração de 6% ao ano mais a variação da TR (apurada a partir do rendimento dos CDBs), isenção de Imposto de Renda e garantia do governo, a poupança já é vantajosa em relação a alguns fundos do mercado.
Aos bancos não interessa manter atrativa a poupança - fator que ajudou o saldo das aplicações, hoje em R$ 190 bilhões, a aumentar R$ 6,5 bilhões apenas em 2006. De cada R$ 100 em depósitos nas cadernetas, as instituições são obrigadas a destinar R$ 65 para o crédito imobiliário, nas regras do Sistema Financeiro da Habitação. Trata-se de uma restrição que impede os bancos de aumentarem ainda mais seus lucros multibilionários.
Além disso, instituições financeiras estavam sendo pressionadas -algo decerto incômodo para seus interesses - a baixar as escorchantes taxas de administração que cobram em seus fundos de investimento. Pequenos aplicadores amargam tarifas de até 5% para que os bancos, com os recursos do poupador, administrem títulos pós-fixados do Tesouro, papéis cujo custo de gestão bancária é irrisório.
O interesse dos bancos, no entanto, não se confunde com o interesse público, que deveria nortear as ações do governo em relação à poupança. A caderneta, nas regras atuais, é de fato um anacronismo herdado de uma época em que prevaleciam a inflação alta e um mercado financeiro simplório e fechado. Não é exagero dizer que foi ludibriado o cidadão que manteve seus recursos aplicados na caderneta desde o advento do Plano Real.
Por conta de um modelo anacrônico, desenhado para garantir recursos à habitação -mas que não conseguiu tirar do rés-do-chão o crédito imobiliário no país-, foi mantido um sistema que pune os pequenos poupadores. Enquanto isso, a título de juros o setor público transfere 7% do PIB por ano aos credores de sua dívida, estes mais bem informados e aquinhoados.
O contexto de juros cadentes seria propício para emancipar do atraso o sistema de poupança popular no Brasil - e, com ele, o modelo de crédito à habitação. Pequenos investidores e trabalhadores, que também vêem seus recursos no FGTS minguarem ao longo dos anos, merecem partilhar os ganhos e também os riscos dessa revolução financeira por que passa o país.
Mas o governo preferiu uma mudança pontual na TR, reduzindo seu peso na correção da caderneta. Os bancos agradecem.

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