Opinião

A resposta americana

Editorial do Estadão
A secretária de Estado americana, Hillary Clinton, ao anunciar que seu país e os demais membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU - China, França, Grã-Bretanha e Rússia - haviam se entendido sobre uma quarta rodada de sanções contra o Irã para frear o seu programa nuclear, fez um comentário revelador. "Este anúncio", avaliou, "é uma resposta convincente aos esforços realizados em Teerã nos últimos dias."

Na véspera, como se sabe, o Irã concordara com a proposta do Brasil e da Turquia para trocar 1.200 quilos de urânio com baixo teor de enriquecimento por 120 quilos do material enriquecido a 20% com fins medicinais. Em outubro passado, um acordo similar, de iniciativa americana, russa e francesa, no âmbito da AIEA, a agência nuclear das Nações Unidas sediada em Viena, foi aprovado pelos negociadores iranianos. Depois, o Irã impôs condições consideradas inaceitáveis para cumpri-lo.

Nem o acordo de Viena nem o de Teerã pretendiam dar conta do desafio da política nuclear da República Islâmica. Cercada de segredo e dissimulação, essa política justifica o temor de que o país, embora signatário do Tratado de Não-Proliferação (TNP), busca os meios de fabricar a bomba. O jogo de gato e rato com os fiscais da AIEA, a descoberta de instalações nucleares clandestinas no seu território e a decisão - reafirmada anteontem - de continuar enriquecendo urânio fizeram o colegiado impor-lhe 3 pacotes de sanções em 3 anos.

O acordo de Viena, no 10.º mês do governo Obama, foi imaginado como teste e ponto de partida para eventuais conversações amplas sobre o impasse nuclear. O recuo iraniano - o mais recente de uma exasperante série - levou os EUA a trabalhar por novas e mais incisivas sanções. Contra isso, o presidente Lula se engajou na intensa atividade diplomática que deu no acordo de Teerã. Em dupla com a Turquia, o Brasil ofereceu ao Irã a chave para reabrir a porta que batera na cara da comunidade internacional há 7 meses. E a oferta vingou, pelo menos por ora.

O fato novo seria uma oportunidade para Washington pôr na geladeira o projeto das sanções, o que por sua vez poderia vir a modificar a equação iraniana. Foi o equivalente a pedir que esperasse para ver. Mas os EUA não só recusaram a trégua, como ainda fizeram o que podiam para conseguir o apoio do mais recalcitrante membro com poder de veto do Conselho de Segurança - a China, que importa do Irã cerca de 14% do petróleo e gás que consome. "Não vemos a hora de saber o que fez Pequim mudar de ideia", espantou-se um editorial do New York Times.

Os chineses dizem defender a tática do "duplo trilho" - sanções com conversações. Como se os orgulhosos iranianos acedessem a sentar-se à mesa enquanto postos de castigo. É bem verdade que os EUA amenizaram as penas para fazê-las passar. Abandonaram, por exemplo, a pretensão de bloquear as exportações iranianas de óleo e as suas importações de gasolina, como Obama chegou a aventar na campanha (enquanto Hillary falava em "obliterar" o Irã). Agora, querem também que a ONU autorize a interceptação de embarcações suspeitas de transportar, de ou para o Irã, armamento e materiais para uso em instalações nucleares.

O aparente paradoxo da insistência dos EUA é que os próprios americanos confidenciam duvidar da eficácia das sanções. As três anteriores não retardaram o programa nuclear iraniano. Por que seria diferente hoje? E como as que estão em pauta no Conselho não serão aprovadas por unanimidade - Brasil, Turquia, Líbano, Nigéria, Uganda e Gabão deverão votar contra ou se abster - tampouco servirão para isolar diplomaticamente o regime dos aiatolás. Qual o ponto, portanto?
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