Opinião
A vitória da direita na Europa
Editorial do Estadão
A primeira vítima política da recessão no mundo desenvolvido acaba de ser identificada. Trata-se do que se chamava no Brasil dos anos 1970 o "raciocínio em bloco". Aplicado à crise, o pensamento simplório levaria à previsão segura de que os partidos conservadores, com a sua filosofia antiestatista e as suas políticas orientadas para o mercado, sofreriam uma derrota devastadora seja lá onde os eleitores fossem às urnas depois do tsunami atribuído à desregulamentação dos negócios financeiros e em meio à onda de desemprego em massa. Eis que o eleitorado dos 27 membros da União Europeia (UE), chamado a escolher os representantes de seus países no Parlamento regional, na votação de quatro dias terminada no domingo, preferiu infligir à centro-esquerda uma humilhação sem precedentes desde a criação do bloco que hoje se estende do Mar do Norte ao Mediterrâneo, do Báltico aos Bálcãs.
Em geral, o resultado desse tipo de eleição tende a refletir o estado de espírito das diferentes populações em relação aos seus dirigentes de turno. Desta vez, a tradição não contou. Em vez dela, impondo-se às questões nacionais, prevaleceu uma impressionante convergência de opinião sobre quais setores políticos estariam qualificados para soerguer as economias europeias. Esse divisor de águas premiou partidos e governantes centro-direitistas e puniu - severamente - partidos e governantes esquerdistas. A centro-direita ocupará cerca de 270 das 736 cadeiras do Parlamento sediado em Estrasburgo. Socialistas e congêneres, 160. Na França, a UMP, o partido do presidente Nicolas Sarkozy, bateu a oposição socialista por 28% a 17% dos votos, o que o autoriza a se declarar o maior vitorioso da disputa supranacional. De fato, nunca antes um presidente francês levou a melhor numa eleição para o Legislativo europeu, em 30 anos de votações.
Na Itália, onde a esquerda contava com a escandalosa vida pessoal do primeiro-ministro Silvio Berlusconi para se desforrar da sua terceira eleição no país, há um ano, a chapa por ele apoiada tornou a bater a do Partido Democrático, de oposição. Na Alemanha, que elege 99 dos 736 parlamentares da UE e onde o governo é conduzido pela chamada Grande Coalizão entre a democracia cristã da chanceler Angela Merkel e a social-democracia, embora o seu partido tenha perdido 6 pontos em relação ao mesmo pleito anterior, superou o aliado por 38% a 21%. "Foi um resultado significativamente pior do que esperávamos", reconheceu o presidente social-democrata Franz Müntefering. Pior também porque pode ser uma prévia das eleições alemãs de setembro próximo. Nesse caso, Angela terá maioria parlamentar suficiente para formar com a União Social Cristã e os Democratas Livres um novo governo de centro-direita puro.
Mais ao centro, mais à direita, conforme o país, essa vertente triunfou expressivamente também na Áustria, Bulgária, Espanha, Holanda, Hungria, Irlanda, Polônia e República Checa, perdendo porém em Portugal, Grécia e Malta. Mas o descrédito da esquerda como solução para a crise não parece ter sido a única razão do seu fracasso eleitoral. Ela também pagou o preço do seu europeísmo diante de um eleitorado mais nacionalista e cético sobre as vantagens da UE. Apenas 43% dos europeus foram às urnas, espelhando o desinteresse de muitos pelas opacas políticas do bloco, o que acabou por enfraquecer o voto moderado e fortalecer as correntes que fazem da xenofobia a sua bandeira.
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Editorial do Estadão
A primeira vítima política da recessão no mundo desenvolvido acaba de ser identificada. Trata-se do que se chamava no Brasil dos anos 1970 o "raciocínio em bloco". Aplicado à crise, o pensamento simplório levaria à previsão segura de que os partidos conservadores, com a sua filosofia antiestatista e as suas políticas orientadas para o mercado, sofreriam uma derrota devastadora seja lá onde os eleitores fossem às urnas depois do tsunami atribuído à desregulamentação dos negócios financeiros e em meio à onda de desemprego em massa. Eis que o eleitorado dos 27 membros da União Europeia (UE), chamado a escolher os representantes de seus países no Parlamento regional, na votação de quatro dias terminada no domingo, preferiu infligir à centro-esquerda uma humilhação sem precedentes desde a criação do bloco que hoje se estende do Mar do Norte ao Mediterrâneo, do Báltico aos Bálcãs.
Em geral, o resultado desse tipo de eleição tende a refletir o estado de espírito das diferentes populações em relação aos seus dirigentes de turno. Desta vez, a tradição não contou. Em vez dela, impondo-se às questões nacionais, prevaleceu uma impressionante convergência de opinião sobre quais setores políticos estariam qualificados para soerguer as economias europeias. Esse divisor de águas premiou partidos e governantes centro-direitistas e puniu - severamente - partidos e governantes esquerdistas. A centro-direita ocupará cerca de 270 das 736 cadeiras do Parlamento sediado em Estrasburgo. Socialistas e congêneres, 160. Na França, a UMP, o partido do presidente Nicolas Sarkozy, bateu a oposição socialista por 28% a 17% dos votos, o que o autoriza a se declarar o maior vitorioso da disputa supranacional. De fato, nunca antes um presidente francês levou a melhor numa eleição para o Legislativo europeu, em 30 anos de votações.
Na Itália, onde a esquerda contava com a escandalosa vida pessoal do primeiro-ministro Silvio Berlusconi para se desforrar da sua terceira eleição no país, há um ano, a chapa por ele apoiada tornou a bater a do Partido Democrático, de oposição. Na Alemanha, que elege 99 dos 736 parlamentares da UE e onde o governo é conduzido pela chamada Grande Coalizão entre a democracia cristã da chanceler Angela Merkel e a social-democracia, embora o seu partido tenha perdido 6 pontos em relação ao mesmo pleito anterior, superou o aliado por 38% a 21%. "Foi um resultado significativamente pior do que esperávamos", reconheceu o presidente social-democrata Franz Müntefering. Pior também porque pode ser uma prévia das eleições alemãs de setembro próximo. Nesse caso, Angela terá maioria parlamentar suficiente para formar com a União Social Cristã e os Democratas Livres um novo governo de centro-direita puro.
Mais ao centro, mais à direita, conforme o país, essa vertente triunfou expressivamente também na Áustria, Bulgária, Espanha, Holanda, Hungria, Irlanda, Polônia e República Checa, perdendo porém em Portugal, Grécia e Malta. Mas o descrédito da esquerda como solução para a crise não parece ter sido a única razão do seu fracasso eleitoral. Ela também pagou o preço do seu europeísmo diante de um eleitorado mais nacionalista e cético sobre as vantagens da UE. Apenas 43% dos europeus foram às urnas, espelhando o desinteresse de muitos pelas opacas políticas do bloco, o que acabou por enfraquecer o voto moderado e fortalecer as correntes que fazem da xenofobia a sua bandeira.
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