A chave da sucessão é o PMDB

Por Ricardo Noblat

“A chave da próxima eleição presidencial é o PMDB. Se Lula e o PT tiverem cabeça, se aliarão ao PMDB para vencer e governar depois”, aconselha o ex-ministro da Casa Civil da presidência da República e ex-deputado José Dirceu de volta a Brasília e à política.

Durante dois dias, despachou com ministros, senadores, deputados e representantes de movimentos sociais. Ao todo foram 15 reuniões. A pedido do PT local, fez uma palestra de três horas para seus militantes na noite da última quarta-feira.

Na manhã de ontem, embarcou para o Rio de Janeiro. Passará o fim de semana em São Paulo ocupado com mais reuniões.

“O PT tem dois bons nomes para o governo de São Paulo, a Marta Suplicy e o Aloizio Mercadante. Mas eu, pessoalmente, estou engajado na campanha da Marta”, revela descontraído enquanto desfruta um charuto cubano refestelado em uma mesa de canto do restaurante Piantella.

“Na capital, 70% do meu pessoal apóiam a Marta. No interior, 70% apóiam o Mercadante. Qualquer um deles será um bom governador.” O PT não governa Estados importantes.

É por isso que Dirceu defende a idéia de o PT apoiar candidatos do PMDB aos governos de nove Estados em troca do apoio do PMDB à reeleição de Lula.

- Podemos apoiar candidatos do PMDB em Estados como Amazonas, Pará, Alagoas, Minas Gerais, Espírito Santo Goiás, Paraná e Santa Catarina, pelo menos. Mas será que o PT estará disposto a se entender com Jader Barbalho no Pará, por exemplo? E com Maguito Vilela em Goiás? – indaga Dirceu.

Ele identifica, pelo menos, duas fortes razões para que o PT se junte ao PMDB. A primeira: “Nenhum partido elegerá mais de 100 deputados federais”. Nas contas do ex-ministro, o PT na Câmara, que soma 90 deputados, deverá ficar 20% menor. Portanto, “para governar será preciso fazer alianças, mas alianças de verdade”.

Segunda razão: “O DNA do PMDB é desenvolvimentista e nacionalista, muito parecido com o nosso”, considera Dirceu. “O PSDB não tem nada disso. Ele hoje expressa o pensamento e as posições dos setores mais conservadores da sociedade”.

Dirceu aposta que o PMDB não realizará as prévias marcadas para escolher em 19 de março seu candidato à sucessão de Lula
– Garotinho ou o governador Germano Rigotto, do Rio Grande do Sul. Mas se realizar, acredita que mesmo assim e até junho o PMDB anunciará seu apoio a Lula.

“Só dependerá de duas coisas: de Lula continuar crescendo nas pesquisas de intenção de voto e da competência dele e do PT para fechar a aliança”, imagina Dirceu. Uma vez que isso ocorra, o PT será obrigado “a compartilhar a coordenação da campanha de Lula com o PMDB e com os demais partidos aliados”.

- Se Lula atrair o apoio do PMDB, um terço de sua reeleição estará resolvida – decreta Dirceu. “E para mim, nada é mais importante do que a reeleição de Lula. Nada”.

No momento, o ex-ministro calcula que o eleitorado se distribua mais ou menos assim: 40% inclinados a votar em Lula e 40% em José Serra. Dirceu parece convencido de que a eleição “será decidida no primeiro turno”. Não está tão certo, porém, de que o adversário de Lula será o atual prefeito de São Paulo.

“As elites preferem Geraldo Alckmin. Elas temem Serra. E até serão capazes de preferir Lula porque já o conhecem e sabem que ele é um caminho seguro”, especula. “A Rede Globo, por exemplo, é contra o impeachment e a reeleição. Mas para evitar Serra, ela poderá ficar com Lula”.

Apesar de ser de esquerda, Lula “é um político por natureza conservador”, testemunha Dirceu. “Eu, por exemplo, sou da esquerda moderada. Tem muitos radicais no PT. Mas Lula, não. Ele é conservador. E entre uma opção com risco e outra sem, ele sempre ficará com a segunda. É o jeito dele. Tem a ver com a origem social dele”, admite.

“Nos idos de 70, um metalúrgico do ABC paulista tinha uma casa na cidade, um pequeno sítio e um carro. Eu, que era da classe média, não tinha nada disso. Morava de aluguel. E o aluguel era pago por minha mulher”.

De certa forma, até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso está empenhado em “ajudar a reeleição de Lula”, confere Dirceu. “Desconfio que ele se filiou ao PT. Porque o que ele anda dizendo contra o governo só beneficia Lula”, ironiza.

(
Aqui, o que FHC anda dizendo contra o governo)

“O ex-presidente tem criticado o que o governo fez de melhor: o Bolsa-Família, o Fome Zero e até a operação tapa-buraco. Onde está escrito que os brasileiros querem a volta do tucanato? Até o Serra deve estar preocupado com o que diz Fernando Henrique e com a postura que ele assumiu. Mas quem foi que disse que o ex-presidente quer a eleição de Serra?”

Ao contrário do que supõe o PSDB, as denúncias de corrupção que atingiram o governo não pesarão tanto na próxima campanha. “Tem corrupção no governo? Tem, como em todo governo. Se eu quiser, amanhã mando prender 50 pessoas. Mas a corrupção não é uma política de governo e não é estimulada ou tolerada por ele”, afirma Dirceu.

“Quando vejo o Quércia liderando as pesquisas para o governo de São Paulo, concluo que a questão ética não terá tanta importância assim. Lembro que em 1992 derrubamos Fernando Collor, mas naquele mesmo ano Paulo Maluf se elegeu prefeito”.

(
Aqui, a pesquisa que mostra Quércia na frente)

Lula faz o melhor governo que o país já teve desde o fim do regime militar em 1985, imagina Dirceu enquanto sorve um cálice de licor e levanta da cadeira para se despedir do deputado José Eduardo Cardoso (PT-SP) que passou pelo restaurante só para encontrá-lo.

“O dólar barato empurra a inflação para baixo, aumenta a renda do trabalhador e barateia o preço da cesta básica”, explica Dirceu. “O povo sente tudo isso no seu próprio bolso. É por isso que Lula continua popular.”

A desdolarização da dívida pública foi a maior realização do governo Lula até aqui, anota Dirceu. Outros dois feitos: a redução da taxa de juros e a criação de empregos.

“O governo chegará ao fim deste ano tendo criado algo como cinco milhões de empregos na economia formal”, projeta Dirceu. “Se somados aos empregos da economia informal, serão 10 milhões. Os brasileiros não terão dificuldade alguma para acreditar na promessa de Lula de que criará sete milhões de empregos em um eventual segundo mandato. Até 2010, a taxa de desemprego cairá para 4%, 4,5%. Os programas sociais darão conta dos desempregados”.

A situação do país poderia ser ainda melhor se Lula não tivesse avalizado uma política econômica tão ortodoxa como a do ministro Antonio Palocci. “No mundo, só o Brasil foi capaz de combinar juros altos com um superávit primário tão elevado”, estoca Dirceu.

“Por causa disso, o governo não investiu em tecnologia e na recuperação das estradas, só para citar duas coisas. É uma vergonha que depois de oito anos de Fernando Henrique e de três de Lula as estradas ainda estejam esburacadas. Os responsáveis por isso deveriam ser fuzilados. Depois a gente comeria uma feijoada e esqueceria o assunto”.

Enquanto foi ministro, assistiu em diversas ocasiões a opinião da área econômica do governo ser derrotada. Lula então mandava liberar dinheiro para obras e programas. E o que acontecia? “Nada. O Tesouro não cumpria a programação de desembolso autorizada pelo próprio presidente”, acusa.

Foi por isso que ele colecionou tantos atritos com Palocci, embora faça questão de dizer que continua seu amigo. “Quando eu estava para ser cassado, ninguém foi mais solidário comigo do que Palocci”, reconhece. “Muitos dentro do governo se acovardaram. E eu paguei tudo sozinho”.

O governo paga o preço, no mínimo, por dois formidáveis erros, constata Dirceu: subestimou “a força da direita que pressionou fortemente a mídia contra Lula e o PT”; e deixou o PT ao desamparo quando escalou 40 dos seus 50 principais dirigentes para cargos na administração pública.

“Deveria ter mobilizado a sua base social para se contrapor à pressão da direita. Eu mesmo deveria ter ficado à frente do PT. Assim poderia tê-lo levado a se opor a tudo com o que não concordávamos. Eu tinha o partido na mão. Poderia ter organizado uma resistência”, analisa o ex-guerrilheiro.

Ao dar a conversa por terminada (mais um monólogo do que uma conversa de fato), o ex-chefe da Casa Civil apaga o charuto que fumou pela metade, informa ao dono do restaurante que em breve reforçará o estoque particular de charutos que mantém ali, despede-se de meia dúzia de amigos que ouviram com atenção seu desabafo, e arremata com ênfase:

- Vejam que eu só falei bem de Lula. Só falei bem.

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