Opinião

Mostrem-se as caras

Mauro Chaves
Estamos criando uma sociedade de escondidos e covardes, em que a proteção é a máscara, a segurança é o disfarce e a garantia de integridade é a dissimulação. A juventude brasileira está aprendendo que para não se ser molestado ou para poder agir impunemente o melhor é não mostrar-se como é - ou mostrar-se como não é -, fugir da identificação e encobrir de todas as formas o próprio ato, a autoria. Na demolição geral de valores em curso, em que as avaliações se falsificam, os critérios se distorcem e o mérito é substituído por cotas, chegamos ao primado do esconso, ao apogeu da camuflagem, à glória da moita - em que feio não é roubar, mas ser visto ao carregar. A mais alta autoridade da República joga um papelzinho de bombom no chão, disfarçado, para ninguém ver - assim como, ninguém vendo, se depredam cabines telefônicas, se picham muros, se saca dinheiro público de cartões corporativos, se usa caixa 2, se ganham mensalões e mensalinhos, se leva dinheiro na cueca.

Em toda a celeuma levantada em torno da "guerra urbana" causada pelos motoboys, em que houve até tentativa (felizmente, frustrada) de se ofertar faixas privilegiadas para o transporte individual, em afronta à prioridade óbvia do transporte coletivo, falou-se de tudo - embora pouco do desastrado veto (de FHC) ao artigo 56 do Código de Trânsito Brasileiro, que proibia (como em qualquer país civilizado) as temerárias e mortíferas "costuras" das motos nas cidades -, mas nem se tocou no fator de maior incentivo à impunidade (quando não à criminalidade) no meio motociclista: o tipo de capacete que é uma máscara perfeita, verdadeiro salvo-conduto para os infratores, de todas as espécies, sobre duas rodas. A resolução do Contran que estabeleceu dispositivos de segurança para os capacetes dos motociclistas (faixas refletivas, selos de certificação do Inmetro, etc.) em nenhum momento cuidou da segurança pública, que depende da identificação dos que usam o espaço público. Em países civilizados se usa o open face helmet - capacetes que permitem "ver a cara" de seu portador, não se tornando um elmo mais escondedor e inexpugnável do que os medievais, maravilha para os bandidos.
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