Opinião

A visão da sociedade e o futuro amazônico

Washington Novaes *
Por onde se caminhará na Amazônia para evitar que o bioma chegue ao desmatamento em 50% de sua área e perca a capacidade de se regenerar, como advertiu o cientista Gilvan Sampaio, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, e Herton Escobar relatou neste jornal (21/11)? Vários fóruns em Manaus discutiram esse tema nas últimas semanas. E um sumário das discussões permitiria enfatizar muitos pontos:O Brasil não tem estratégia para a Amazônia.


Não há recursos para implantar o cadastro fundiário (só 4% das terras são registradas), monitorar o território, fiscalizá-lo e impedir o desmatamento ilegal: o Ministério do Meio Ambiente só tem cerca de 0,5% do Orçamento federal.

Não há "transversalidade" na política federal, cada Ministério cuida de seus interesses específicos - enquanto isso, já há ali mais de 70 milhões de cabeças de gado e cerca de 20% do bioma foi desmatado para a expansão agropecuária e extração ilegal de madeira (mais de 150 mil km2 só de 2000 para cá).

"Reserva legal" em cada propriedade é apenas ficção.

Os gastos federais no bioma não passam de 4,05% do total, enquanto a população amazônica supera 12% da população brasileira.

A região continua a ser receptora de mão-de-obra desempregada em outras partes.

Continuam sem resposta as objeções de cientistas à lei que permite concessão de terras públicas para "manejo" por empresas (países que entraram por esse caminho perderam suas florestas).

Seria possível destacar muito mais pontos, mas não é necessário, o tema tem sido muito tratado. Talvez seja interessante salientar algumas discussões por outros ângulos, que ocorreram durante o recente Simpósio de Cultura e Natureza na Amazônia, parte do Festival Literário Internacional da Floresta, na parte que tratou especificamente de "desenvolvimento e natureza na Amazônia".

Era inevitável que se falasse ali do tema da "ameaça de internacionalização da Amazônia". Vários conferencistas lembraram, entretanto, que de certa forma essa "internacionalização" já ocorre, uma vez que grande parte das mais importantes atividades econômicas no Estado está voltada para interesses externos - a exportação de madeira, soja e carne para países que não querem arcar com os custos socioambientais dessas atividades (que são pesados); a exportação de ferro-gusa e alumínio, que têm altíssimo custo ambiental e energético (em grande parte subsidiado e transferido para a conta de toda a sociedade brasileira); a Zona Franca para empresas de outros países; o comércio de minérios - para só citar alguns. Pode ser interessante, entretanto, colocar o foco sobre a questão da falta de uma "identidade amazônica" (decisiva durante séculos para a conservação da floresta), que dificulta a formulação de uma estratégia competente e necessária. Vale a pena começar, aí, por uma intervenção do sociólogo e poeta João de Jesus Paes Loureiro, autor de vários livros sobre a realidade cultural amazônica, para quem "o imaginário popular é uma visão de progresso social", com sua "crença em vidas possíveis".
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Washington Novaes é jornalista
wlrnovaes@uol.com.br

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