Ponto de vista

Uma direita além dos clichês

Pedro Doria em Weblog
O Brasil já teve bons colunistas de direita. Hoje, não tem. Repetir uma meia dúzia de clichês é fácil. Bater no governo por cacoete, idem. Platéia para o aplauso não faltará. (Blogs com comentários hiper-moderados facilitam muito a vida de quem busca aplauso, à direita e à esquerda; no tempo do impresso não tinha isso.)
David Brooks, do New York Times, é um bom colunista de direita. Do tipo que dá prazer de ler mesmo que seja para discordar.
É o caso de
sua análise da história de Diane McLeod, publicada pelo próprio Times, no domingo. Diane é um dos muitos exemplos por trás da atual crise econômica dos EUA. Recém-separada, deprimida, se deixou seduzir por crédito fácil que conseguiu no cartão de crédito e numa hipoteca da casa. Suaves prestações mensais por dinheiro na mão de imediato.
Curou a depressão no shopping center. Como milhões de pessoas. A bolha do crédito com juros flutuantes explodiu.
História contada, Brooks se lança a descrever as reações imediatas de esquerda e de direita:
A esquerda lê sobre o drama de Diane McLeod e vê um Estado que falhou em regulamentar agentes e empresas de financiamento que flertaram abertamente com o estelionato.
A direita, por sua vez, vê apenas Diane McLeod, uma pessoa que, individualmente, assumiu a responsabilidade por uma dívida e problema dela. Governo e sociedade nada têm a ver com os erros de indivíduos.
O problema não é apenas que, no fim das contas, ambos estão certos. Tampouco que são visões simplistas duma situação que, repetida muitas vezes, está desencadeando uma grave crise econômica. Brooks:
A terceira forma de ver a situação começa com a percepção de que todas as pessoas têm inerte o desejo de ganhar o respeito de seus pares. Indivíduos não constroem suas vidas do nada. Eles absorvem os padrões e normas do mundo ao seu redor.
Tomar decisões – seja a contração de um empréstimo ou a decisão de com quem casar – não é um ato friamente racional. A tomada de decisão vem de uma longa rede de processos e muitos deles não são de todo conscientes. Absorvemos uma maneira de perceber o mundo vinda de nossos pais e vizinhos. Reproduzimos o comportamento daqueles a nossa volta. Só no fim deste processo há motivação consciente.
Se estas premissas estiverem certas, o que aconteceu com McLeod e o sistema financeiro nacional faz parte de uma história social mais ampla. Os Estados Unidos já tiveram uma cultura de gastos comedidos. Mas, nas últimas décadas, ela ruiu silenciosamente.
O tom da coluna é conservador. As escolas, diz Brooks, costumavam arraigar a idéia de pecado na sociedade puritana. Isto não acontece mais. Incentiva-se o consumismo e o fato de ele ser um pecadilho provoca piadas, não asco. É evidente, sugere o colunista, que no fundo o comportamento que corroeu as normas se dá em infinitas decisões pessoais.
‘A virada do mercado irá punir aqueles seduzidos pelas tentações do mercado’, ele conclui. (Direita, nos EUA, mistura puritanismo com Adam Smith.)
No final, pode-se discordar da leitura. Acaso o Estado regulasse atentamente o mercado, certos dramas poderiam ter sido evitados. Não todos, só alguns. Mas direita inteligente vai muito além de seus próprios clichês para compreender uma crise econômica ou suas vítimas.

Comentários

Anônimo disse…
Discordo...Reinaldo Azevedo!!!

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