Noturnas

Pequenos e involuntários assassinatos

Sidney Borges
Há pouco eu ouvia Laura Figi nesta segunda-feira gelada e escura. Lembrei-me da compra do CD. Foi num fim-de-ano de um fim-de-século no Shopping Morumbi, em São Paulo. Susan e eu fazíamos compras, logo iríamos para a Inglaterra por alguns meses, estávamos comemorando alguma coisa. Não me lembro exatamente o que. De repente o som invadiu o ambiente, que voz incrível pensei, e que arranjo sensacional. Preciso comprar esse disco. Na loja eu disse ao vendedor: - Quero esse disco. Ele replicou dizendo que era o último. Quando fui ao balcão outro cliente também queria e eu tive de brigar para ficar com a Laura Figi. Consegui. Agora ela é toda minha, canta na hora que eu quiser. Pra ficar com a mulher amada é preciso lutar, mas se ela não mostrar interesse o melhor a fazer é arranjar outra. Se a Laura Figi não me quisesse eu compraria outro disco. Da Julie London, por exemplo. Mas o assunto que eu tinha em mente quando comecei a escrever este texto não era bem esse. Estou um pouco aéreo. O que eu queria dizer é que depois de esticar as canelas acho que terei problemas com as autoridades celestiais. Por causa dos piolhos de cobra que matei. Foram muitos. Todos os dias mato pelo menos um. Quando menos espero vem o barulhinho inconfundível. Scratchhhh. Pronto, no chão o cadáver, muitas vezes estrebuchando. Juro que é verdade o que vou dizer. Nunca matei de propósito. Acidentes acontecem. Como atenuante aos meus crimes, afirmo que os piolhos de cobra seguem rotas inusitadas, caminhos que quase sempre cruzam com os meus. Têm, portanto, culpa no cartório. Sratchhhhh. Não sei se terei sucesso na empreitada, talvez eu não consiga me explicar e então serei condenado. Desde que não me condenem a morrer sem amor, tudo o mais suportarei.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu