Varig, Varig, Varig
No longínquo ano de 1983 fui convidado a fazer um boneco para uma publicação de luxo. Como a grana era boa, topei na hora. Para quem não sabe, bonecos são instrumentos de venda. Os departamentos comerciais precisam deles para mostrar às agências onde serão veiculados os anúncios dos clientes. Consistem em simulacros de revistas, feitos à mão, com fotografias e textos recortados e colados em brochuras de papel previamente preparadas. Naquele tempo não existiam “pagemakers” e “photoshops” nem impressoras coloridas. Obviamente, depois da revista lançada, o boneco gasto pelo manuseio acaba virando peça de museu. Antes de vir morar em Ubatuba eu ainda tinha o que confeccionei para a Varig lançar a Ícaro, revista de bordo que suponho ainda exista. Depois de fazer o boneco permaneci por um ano na Varig, como diretor de arte da revista. Tenho, portanto licença para falar da Varig, conheci a empresa por dentro, suas virtudes e de seus imensos defeitos. A Varig sempre vivenciou turbulências nas rotas. A forma como era administrada prenunciava dias difíceis. No setor onde trabalhei, por exemplo, havia um chefe que ostentava seis automóveis Mercedes Benz. Isso mesmo, em uma época em que a importação era proibida e os carros de luxo custavam os olhos da cara. No mesmo setor, outro diretor recém-nomeado passava os dias sem saber o que fazer, passeando de um lado para outro. No fim do mês embolsava polpudo salário, equivalente ao de um comandante. Motivo de estar lá: era amigo do presidente da empresa, para quem comprava gado. Isso era prática comum, com a agravante do nepotismo. Os diretores “pouca prática” traziam consigo sobrinhos, primos, irmãos, amantes e, pasmem, até esposas legítimas. Passageiros e governo pagavam os salários. Apesar dos visíveis desmandos, de pleno conhecimento dos gestores da fundação Rubem Berta, nada jamais foi feito. Sempre haveria socorro para a “Pioneira”. Por outro lado, contrastando com a administração suicida, havia o setor produtivo, constituído por pilotos, comissários, mecânicos, despachantes e outros, que ligados ao vôo criaram a reputação de excelência que a Varig ostenta até hoje, mas que aos poucos vai sendo desmontada pelas circunstâncias. Se for possível manter vivo o lado virtuoso, o governo deve fazer a sua parte. Essa Varig é viável. Quanto ao resto, é lixo e deve ser jogado fora.
Sidney Borges
Sidney Borges
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