Angra 3. Sim ou Não?



A verdade sobre os custos da energia nuclear

Gloria Alvarez

Um dos documentos anexados ao processo de licenciamento ambiental da Usina Angra 3, durante a audiência pública que discutiu o Estudo e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) dessa unidade, em Ubatuba (SP), no último dia 28 de março, foi uma “Nota Técnica”. A mesma foi assinada pelo Assistente da Presidência da Eletronuclear, Leonam dos Santos Guimarães, e pelo Gerente de Planejamento e Orçamento, Roberto Cardoso de Andrade Travassos, rebatendo o documento do Greenpeace que discute custos da energia nuclear.

Eis a íntegra do documento:

Introdução

Uma meia verdade é também uma meia mentira. A partir de dados técnicos, econômicos e financeiros, públicos e transparentes, disponibilizados pela Eletronuclear para o empreendimento Angra 3, a organização internacional GREENPEACE está divulgando um documento intitulado “Elefante Branco – Os Verdadeiros custos da Energia Nuclear” (anexo 1), cuja autoria está sendo indevidamente atribuída à Universidade de São Paulo – USP. Tal atitude maliciosa objetiva associar a notória competência técnica e credibilidade da maior universidade do Brasil a uma flagrante manipulação de dados à serviço de um conjunto de pressupostos ideológicos.

Tal documento é composto por três capítulos: “Introdução”, “Viabilidade econômica de Angra 3 – Estudo de caso realizado pela Universidade de São Paulo” (sic), “Os verdadeiros custos da energia nuclear” e “Conclusão”. A única relação que este documento guarda com a USP decorre de uma declaração (anexo 2), assinada por Miguel Edgar Morales Udaeta e datada em 18 de março de 2008, na qual consta que um grupo de pesquisadores vinculados à USP realizou um estudo técnico econômico de Angra 3 que foi reproduzido na íntegra no capítulo “
Viabilidade econômica de Angra 3 – Estudo de caso realizado pela Universidade de São Paulo” (sic), do documento intitulado “Elefante Branco – Os Verdadeiros custos da Energia Nuclear”. Afirma ainda o declarante que o documento é “de autoria do GREENPEACE” (grifo nosso).

Afirma ainda a citada declaração que “a interpretação e eventual extrapolação dos dados técnicos feita posteriormente pelo GREENPEACE”, isto é, os capítulos “Introdução”, “Os verdadeiros custos da energia nuclear” e “Conclusão” do documento, “não são de responsabilidade desta equipe de pesquisadores” (grifo nosso).

O título do segundo capítulo do documento, “Viabilidade econômica de Angra 3 – Estudo de caso realizado pela Universidade de São Paulo” (sic), além de diversas outras citações feitas nos capítulos cuja autoria não foi assumida pelo grupo de pesquisadores da USP, liderados pelo Sr. Miguel Edgar Morales Udaeta, demonstram claramente o uso indevido do nome da Universidade pela organização internacional GREENPEACE.

Note-se aqui, de passagem, que grande parte dessas “interpretações e extrapolações dos dados técnicos feita posteriormente pelo GREENPEACE” não guarda nenhuma relação com os resultados apresentados pelo grupo de pesquisadores contratado para elaborar o estudo ou foram feitas de forma capciosa, embutindo equívocos técnicos que levam o leitor desavisado a acreditar em pressupostos ideológicos defendidos por essa organização internacional.

Em que pese este vício de origem do documento, bem como a malícia com que os dados públicos e transparentes disponibilizados pela Empresa para o empreendimento Angra 3 e o estudo dos pesquisadores da USP deles decorrente foram manipulados a serviço dos interesses da organização internacional GREENPEACE, o que lhe retira toda credibilidade, a ELETRONUCLEAR, dentro da sua política de transparência e comunicação com a sociedade brasileira, analisou tecnicamente seu conteúdo.

O objetivo dessa nota técnica é, portanto, analisar, de forma não exaustiva, alguns dos tópicos do documento emitido em março de 2008 pelo GREENPEACE intitulado “Elefante Branco – Os Verdadeiros custos da Energia Nuclear”, elaborado por equipe de pesquisadores vinculados à USP e indevidamente creditado a essa respeitabilíssima instituição por essa organização internacional.


Histórico

Ao longo dos últimos anos a Eletronuclear tem participado de simpósios, conferências e congressos divulgando, através de trabalhos técnicos, o estudo de viabilidade econômico-financeira do empreendimento Angra 3, como por exemplo em novembro de 2004 no Clube de Engenharia (Rio de Janeiro - RJ), em setembro no “International Nuclear Atlantic Conference - INAC 2005” (Santos – SP), em agosto de 2006 no “XI CBE – Congresso Brasileiro de Energia” (Rio de Janeiro – RJ).

Evidentemente, ao longo desse período o estudo vem sofrendo aprimoramentos e atualizações devidas à contribuições de terceiros e atualizações monetárias (inflação, câmbio etc).

É conveniente salientar que os dados utilizados pela Eletronuclear para o empreendimento Angra 3 (orçamento, viabilidade, tarifa etc) vem sofrendo ao longo desses últimos anos confirmações por parte de diversas entidades independentes de a saber: IBERDROLA (Espanha), Electricité de France – EDF (França), EPRI / ORNL (Estados Unidos), COPPETEC (Coppe / UFRJ), Fundação Getúlio Vargas (FGV / RJ), Fundação da Universidade de São Paulo (FUSP), COLENCO (Suíça) e mais algumas consultorias nacionais independentes (Mercados, Excelência Energética), além do recente Grupo de Trabalho que conta com a participação de representantes da Casa Civil da Presidência da República, Ministério das Minas e Energia, Eletrobrás e Eletronuclear.

Recentemente, em dezembro de 2007, a Eletronuclear recebeu um convite para participar de um debate no Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (IEE/USP), quando apresentou uma palestra no dia 12 de dezembro de 2007 para os pesquisadores do IEE/USP e demais público presente. Essa palestra, apresentada em MS PowerPoint, foi disponibilizada em papel e meio eletrônico para os pesquisadores da IEE/USP e público presente. Naquele momento a Eletronuclear se colocou à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais, como objetivo de manter o total entendimento e transparência quanto aos estudos de viabilidade do empreendimento.

Foi com total surpresa que a Eletronuclear depara agora com esse dito estudo do GREENPEACE, realizado por técnicos provenientes dos quadros do IEE/USP e do GEPEA/EPUSP e com base nos dados disponibilizados pela apresentação da Eletronuclear no IEE/USP em 12 de dezembro de 2007.


Comentários sobre o documento do Greenpeace

A seguir são apresentados alguns dos principais comentários sobre os principais pontos do documento do GREENPEACE (grifo nosso).

1 Introdução do Documento

Ø Segundo o documento: “Os outros 30%, referentes à importação de bens e serviços, serão financiados por empresas internacionais como a estatal francesa Areva2, maior geradora de energia nuclear do mundo na atualidade”.
Primeiramente, a Areva não financiará quaisquer parcelas do empreendimento, haja vista que a mesma é uma fornecedora de bens e serviços na área nuclear, não sendo também uma geradora de energia elétrica por fonte nuclear.
Na realidade, a parcela de bens e serviços importados para Angra 3 será financiada por agentes financeiros, que poderão ser estrangeiros e/ou nacionais.

Ø Segundo o documento: “Além de ter aprovado o investimento de mais de R$ 7,2 bilhões em um projeto controverso e perigoso como uma usina nuclear sem discutir com a sociedade ou o Congresso Nacional, o governo federal não detalhou os verdadeiros custos de Angra 3 ou assumiu os subsídios ocultos no projeto”.
Em primeiro lugar, a segurança de usinas nucleares pode ser comprovada pelo longo tempo de operação segura de mais de 400 plantas em operação no mundo. Não se tem conhecimento de qualquer acidente com liberação de radiação para o meio exterior provenientes de usinas que utilizam a mesma tecnologia que Angra 3, usinas a água Leve Pressurizada. No Brasil essa constatação pode ser comprovada pela operação das usinas nucleares Angra 1 e Angra 2, que nunca apresentaram quaisquer riscos à seus trabalhadores, ao público em geral e ao meio ambiente.
A Eletronuclear vem ao longo dos últimos anos divulgando e detalhando os custos do empreendimento Angra 3, através de diversos documentos encaminhados à órgãos governamentais, apresentações técnicas em simpósios, seminários, congressos e, ao público em geral, através da realização de palestras para as quais a Eletronuclear é convidada,
Nesses custos não existem quaisquer subsídios ao empreendimento Angra 3, sendo que todo o investimento a realizar será recuperado através dos recebimentos pela venda da energia a ser gerada pela usina, a qual estará atrelada à tarifa estipulada para a comercialização da energia.
Portanto, é totalmente descabida a afirmação do documento do GREENPEACE.

Ø Segundo o documento: “Angra 2 entrou em operação apenas em 2000, após inúmeros atrasos de cronograma e falhas técnicas”.
Os atrasos no cronograma de Angra 2 são atribuídos à não alocação dos recursos necessários ao empreendimento em prazos consistentes com o planejamento original. Caso esses recursos tivessem sido alocados conforme as reais necessidades, o cronograma de implantação de Angra 2 não teria sofrido qualquer atraso.

Ø Segundo o documento: “... ,e muito mais relevante, o estudo evidencia que o governo conduziu uma verdadeira engenharia para apresentar uma tarifa que viabilize, ao menos aparentemente, o uso da energia nuclear no Brasil”.
A tarifa de equilíbrio para a energia a ser gerada por Angra 3, calculada e divulgada pela Eletronuclear nos mais diversos fóruns e ocasiões, está respaldada em cálculos de engenharia econômica-financeira realizados por sua equipe técnica e verificada por consultores especializados, organizações nacionais e internacionais de renome comprovado e Grupos de Trabalho formados a partir de solicitações governamentais.

2. Capítulo I do documento: “ Principais Custos Vinculados a Angra 3”

As tabelas I.1 e I.2 apresentadas pelo GREENPEACE foram parcialmente copiadas da apresentação da Eletronuclear (anexo 3), baseada no relatório da Empresa – “Angra 3: Avaliação Econômica-Financeira do Empreendimento – revisão 3a de 12 de junho de 2007” (anexo 4), mas modificada quanto ao valor total do investimento previsto que é de R$ 7,355 bilhões (investimento a realizar) e não os R$ 9,22 bilhões apregoados pelo GREENPEACE.

Na apresentação da Eletronuclear é apresentada uma tabela com o reajuste em R$ e Euros de dezembro de 2001 para dezembro de 2007 do orçamento da FUSP, considerado o orçamento oficial de Angra 3. Considerando a parcela do ativo imobilizado relativa aos investimentos diretos esse valor é de R$ 7,951 bilhões (“Overnight Cost”).

Em nenhum projeto que se tenha conhecimento na área de usinas para geração nucleoelétrica, o valor dos juros durante a construção (JDC) é adicionado ao “Overnight Cost” do mesmo, já que esses JDC serão considerados e quitados durante a operação normal da planta, através dos valores arrecadados com a venda de energia elétrica com a tarifa de equilíbrio calculada pela metodologia de fluxo de caixa descontado, conforme realizado de maneira completamente transparente pelo estudo da Eletronuclear. Não há, portanto, nenhum subsídio ou valor escondido como pretende fazer crer erroneamente o estudo do GREENPEACE.

Quanto ao progresso físico acumulado atual do empreendimento Angra 3 de cerca de 30% é devido aos fatores descritos na apresentação da Eletronuclear (anexo 3). Evidentemente, como a autorização para a retomada ainda não foi dada, esse progresso se mantém constante, sem alterações. É conveniente salientar que os equipamentos já comprados estão estocados e em perfeito estado para a sua utilização a qualquer momento, pois sofrem um rigoroso programa de preservação e manutenção.

Quando ao prazo de 66 meses para a conclusão do empreendimento a partir do início de concretagem da laje de fundação do Edifício do Reator, o mesmo é perfeitamente factível com base nas experiências de construção de Angra 2 e internacionais.

O documento do GREENPEACE apresenta em seu item I.2 Custos de investimentos e operação de Angra 3 uma série de valores não condizentes com os valores reais de Angra 3 (por exemplo: potência nominal abaixo da projetada para Angra 3, fator de capacidade menor, maior número de paradas programadas para troca de combustível nuclear, adição inadequada de uma “Work fee”, custos de manutenção e operação etc) e de uma maneira bastante simplista faz o cálculo da tarifa em R$137,69/MWh (menor que o valor calculado pela Eletronuclear), considerando, neste caso, uma taxa de câmbio de USD1,00=R$1,796 (em outros trechos do documento, a taxa de câmbio utilizada é USD1,00=R$1,75). Mesmo com essas inconsistências técnicas, o documento apresenta uma tarifa inferior àquela calculada pela Eletronuclear utilizando a metodologia de fluxo de caixa descontado (R$138,20/MWh). Ou seja, uma diferença a menor de cerca de 0,4%, que é irrisória para um projeto dessa complexidade.

Na apresentação disponibilizada pela Eletrobrás aos pesquisadores da IEE/USP em dezembro de 2008 (anexo 3), esses valores estão definidos de maneira clara e transparente, sem as citadas inconsistências técnicas e considerando todas as variáveis envolvidas, sem ocultar absolutamente nenhum dado relevante, diferentemente do que o organização internacional GREENPEACE pretende fazer crer à sociedade brasileira.

É também totalmente descabida a afirmação do GREENPEACE de que somente é remunerado o capital de terceiros e não o capital próprio. Na apresentação da Eletronuclear aos pesquisadores do IEE/USP (anexo 3) está claramente indicado que foi considerada uma remuneração de 10% aa do capital próprio dos acionistas e, foi até calculado os valores dos encargos e dividendos devidos ao fim da construção, a serem pagos durante a operação da planta, através dos valores arrecadados com a venda de energia elétrica com a tarifa de equilíbrio calculada pela metodologia de fluxo de caixa descontado.

3. Comparativo com estudo Eletrobrás

Os gráficos 1 e 2 e as tabelas 2.1 e 2.2 apresentadas no documento do GREENPEACE são apenas transcrições dos valores calculados pela Eletronuclear para o empreendimento Angra 3 e disponibilizados para os pesquisadores do IEE/USP em dezembro de 2007 (anexo 3).

Conforme já esclarecido anteriormente, os juros durante a construção (JDC) da planta não são adicionados ao “Overnight Cost” da mesma, já que esses JDC serão considerados e quitados durante a operação normal da usina, através dos valores arrecadados com a venda de energia elétrica com a tarifa de equilíbrio calculada pela metodologia de fluxo de caixa descontado, conforme realizado de maneira completamente transparente pelo estudo da Eletronuclear. Portanto, os comentários do documento do GREENPEACE são desprovidos de qualquer base técnica consistente.

4. Conclusões do estudo de caso

Os gráficos 3 e 4 apresentadas no documento do GREENPEACE são apenas cópias do apresentado pela Eletronuclear em dezembro de 2007 (anexo 3).

A afirmativa no documento do GREENPEACE de que uma Taxa Interna de Retorno (TIR) de 10% aa é muito baixa não procede. A TIR representa a remuneração do risco do empreendedor na aplicação de seu capital. Quanto maior a TIR, maior será a remuneração do empreendedor decorrente da maior tarifa de venda futura de seu produto para a sociedade. A TIR está associada ao volume do investimento e da receita futura a ser gerada, bem como ao prazo de amortização e vida útil do empreendimento.

Pelas mesmas razões, os governos nacionais estabelecem duas taxas de juros de referência da economia nacional, de curto e longo prazo (no caso do Brasil, SELIC e TJLP).

Para empreendimentos de geração de energia elétrica de grande porte e com longos ciclos de vida (no caso de Angra 3 o prazo considerado é de cerca de 46,5 anos), TIR de 10%, e até menores, são normalmente aplicadas, como, por exemplo, para grandes projetos hidrelétricos.

A comparação da TIR adotada para o empreendimento Angra 3 com a suposta TIR adotada por empreendedores privados para investimentos em projetos de geração termelétrica convencional e pequenas centrais hidrelétricas e eólicas é totalmente descabida, por serem empreendimentos completamente diferentes em termos de prazos, custos e natureza jurídica do empreendedor.

Cabe ressaltar a geração nucleoelétrica não faz parte do “mercado”, na medida que constitui um monopólio da União. Além disso, valores da TIR de 12-15%, julgados pelo estudo como “compatíveis com o mercado”, não são, por exemplo, aqueles considerados pela ANEEL para revisão tarifária das concessões, da ordem de pouco mais de 9% aa.

5. Considerações sobre as conclusões do GREENPEACE no capítulo “Os verdadeiros custos da energia nuclear”.

As conclusões do documento do GREENPEACE são totalmente parciais e deformadas e não estão em consonância com a tendência mundial de retomada da construção de usinas nucleares para a geração de eletricidade (a dita renascença da energia nuclear) em diversos países do mundo tais como: França, Estados Unidos, Inglaterra, Finlândia, China, Índia dentre outros.

A energia nuclear está sendo considerada uma das fontes menos poluidoras e não contribuintes para o aquecimento global do planeta, conforme recentemente confirmado pelo “Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC” (Grupo de Trabalho III, Summary for Policy Makers), no qual a energia nuclear é incluída como uma tecnologia-chave para a mitigação das mudanças climáticas no horizonte 2030, conjuntamente com as demais fontes renováveis de energia.
Gloria Alvarez
Assessora Técnica do Diretor-Presidente
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