Pensata

Infância: Anos decisivos para a sociedade

Lourdes Moreira
Temos a mais nobre das profissões. Todas as profissões são dignas mas a nossa é aquela que parece coadjuvante e que tem se tornado a atriz principal na sociedade atual: somos professores. Somos mestres mesmo que não tenhamos mestrado, somos educadores, somos sustentáculo da família no auxílio ao educar seus rebentos. Somos aqueles que mães e pais entregam seus filhos para que possam ir mundo afora defendendo seus compromissos sejam eles profissionais ou pessoais. Lá ficamos nós com a tarefa maior de, ao olharmos em olhos que tanto esperam de nós, possamos, no mínimo, transformar seus dias em fonte de conhecimento, de afeto, solidariedade, e tantos outros substantivos que possamos enumerar. É na sala de aula e na relação rotineira que se darão e se expressarão as diferentes relações e reações humanas. Será quando contrariada que a criança expressará sua insatisfação e, nessa, sua construção familiar antes de chegar à escola. Se agir com compreensão ou frustração, logo perceberemos como foi sua criação. Sua primeira célula social.

Falarmos de crianças que tem essa célula sedimentada é fácil, difícil é falarmos sobre crianças que não tiveram norteador em seus primeiros anos de vida. Que foram açoitadas da convivência familiar, ou melhor, que de uma forma ou de outra foram rejeitadas pelos que as colocaram neste mundo. Há sentimentos de perda terríveis, mas, haverá sentimento mais triste que o da rejeição?

Todo ser humano necessita da aprovação do outro em seu cotidiano. Seja num sorriso, num abraço ou num simples “ok, você agiu bem”. E aí nos deparamos com as crianças que são abandonadas por seus pais... E aí nos deparamos com a procuradora de justiça carioca aposentada, Vera Lúcia de Sant’Anna que cometeu atos extremamente agressivos contra T.E. de cerca de 2 anos de idade e que tanto nos horrorizou.

Por que nos horrorizou? Porque acreditamos que todo ser humano deva ter no mínimo DIGNIDADE. Dignidade para consigo e para com o outro e, nesta, exerça sua profissão e que, no dia a dia, transforme suas ações num constante crescimento de si e de seu igual. Vera o fez?

Vera Lúcia teve em sua GUARDA PROVISÓRIA, por 29 dias, uma criança que pretendia adotar. Segundo a revista Veja de 26/05/10 ela confessou que queria adotar uma criança para que sua aposentadoria não ficasse para o “estado” e seus bens ficassem para quem precisasse.

Bem, se a guarda era provisória, Vera deveria ter sido visitada por assistentes sociais amiúde para verem em que situação T.E. se encontrava sob a guarda da ex-procuradora.

Tudo isso nos comprova a ineficácia da burocracia brasileira que é séria e exigente ao fazer entrevistas psicológicas e ao analisar se o pretendente a uma adoção responde a processos criminais. Ineficaz ao permitir que uma criança ficasse sobre a “proteção” de uma pessoa, segundo entrevistadores, apresentando traços de personalidade psicótica (aquelas pessoas que entendem a diferença entre o bem e o mal, mas não parecem sentir sinais de arrependimento frente à dor do outro), 15 passagens anteriores pela polícia sem nenhuma delas evoluir para a fase judicial. Ou seja, Vera já havia tido em sua vida casos envolvendo questões policiais, inclusive uma delas numa tentativa anterior de adoção e que a mãe (feliz da criança?) desistiu e que ela quis de volta até a roupa que presenteara à criança.

Triste Vera. Pensar que nossas crianças precisam apenas de roupas e de uma aposentadoria é de uma realidade alarmante aos encéfalos mais pensantes e não arrogantes como nós devemos, continuamente sermos, como educadores DIGNOS: sabermos que crianças necessitam antes de tudo de colo, proteção, segurança, amor extremo, educação e não dinheiro e bens. Estes, se nossas crianças rejeitadas um dia tiverem, serão felizes não por o terem, mas sim por terem tido antes a chance de terem sido incluídos numa família que os fará felizes.

Vera trouxe à mostra que a realidade de nossa sociedade ainda é do “você sabe com quem está falando?” (Afinal uma procuradora da Justiça é... uma procuradora da justiça). Por isso uma criança foi espancada e por Vera, sua “guardiã”. Prazer atroz que pode dilacerar eternamente a formação moral, emocional e intelectual de T.E. Mesmo e após o veredicto de que Vera, já presa após dias de fuga, terá de custear o tratamento psicológico de T.E. e lhe pagar pensão mensal de 10% de sua aposentadoria enquanto viver. Será que se fossem simples cidadãos teriam recebido a guarda de T.E.?

Nós professores necessitamos que nossas crianças sejam esclarecidas sobre seus deveres e direitos para que saibam que o tratamento que dispensam aos outros e o, a elas dispensado, deve ser o da DIGNIDADE HUMANA. De que não podem dar aos seus iguais e não merecem receber qualquer tratamento que envolva a selvageria. As famílias devem ter clara a importância de seu papel no crescimento e desenvolvimento de seus filhos. As instituições públicas tem que cumprir seus papéis e não apenas as consequências de suas falhas.

Crianças necessitam de pais que tenham orgulho de tê-los tido e depois de professores que os façam sentir cada vez mais amados e importantes no dia a dia da sociedade em que, futuramente, desempenharão papéis que um dia nos foram atribuídos.

Espero que E.T. um dia seja uma pessoa bem resolvida emocional e intelectual e que Vera seja apenas uma vaga lembrança em seu futuro desenvolver.

Que nós , professores, deixemos de ser atores principais na formação dos futuros cidadãos. Que voltemos a ser coadjuvantes, mas extremamente respeitados como auxiliadores da família e que não nos subjuguem como Vera fez com E.T. jogando por sobre nossos ombros a responsabilidade que não é nossa, mas sim dela mesma. Que esta continue a ser a primeira célula social da criança e que nós, professores (escola), continuemos sendo a segunda lhes ajudando na continuidade do desvendar o saber.

Todos devemos desenvolver nossos papéis com muita NOBREZA e DIGNIDADE e aqueles que não o fazem terem claro que, cada vez mais, os cidadãos estão cobrando o RESPEITO ao outro e à SOCIEDADE.

A INFÂNCIA É O MOMENTO ÚNICO PARA CONSTRUIRMOS O QUE DE MELHOR NOSSA SOCIEDADE TERÁ NO AMANHÃ.

Lourdes Moreira
Profª da Rede Estadual e Municipal
De Ubatuba

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