Opinião

Reduzir emissões ou mudar a vida?

Washington Novaes
Rosto tenso, aparência de extremo cansaço, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, começou sua entrevista final em Copenhague dizendo ter consciência da profunda decepção dos participantes com o "fracasso da COP 15". Mas pediu que entendessem que "o desafio do nosso tempo" não é apenas chegar a regras para reduzir emissões, mas tem que ver com formatos de "mudar o mundo, nossas formas de viver".


Ficava subentendido que, se já há obstáculos quase intransponíveis para fixar regras globais para baixar as emissões, incrustados nas lógicas financeiras de países ricos e pobres, governos, setores econômicos, empresas e até pessoas (tenho de dividir minha renda, trocar de carro, reformar minha casa para consumir menos energia, tornar-me vegetariano, etc.?), que dirá definir um novo modo de viver em qualquer parte e que nos leve a superar essa crise do padrão civilizatório com seus caminhos incompatíveis com a capacidade do planeta? Um modo de viver que, no dizer do famoso biólogo Paul Ehrlich, nos leve a respeitar os direitos de qualquer ser vivo? Talvez por isso tudo Ban Ki-moon terminou afirmando que "é hora de compromisso, de coragem".

Neste momento em que cada país atira sobre outros a culpa pelo "fracasso", é inevitável que venha à memória a Cúpula do Desenvolvimento de 2002, em Johannesburgo, quando a evidência dos impasses já era muito forte e, em eventos paralelos, se discutiu a possibilidade de criar caminhos alternativos, já que nas conferências da ONU é indispensável, para qualquer decisão, o consenso entre quase 200 países com interesses contraditórios. Uma militante ambientalista sugeriu que seria indispensável "tomar o poder na Organização Mundial do Comércio", a seu ver o foro onde se decidiam os destinos do mundo. Já uma alta autoridade no âmbito internacional propôs a criação de uma organização mundial de meio ambiente, separada da ONU e de suas regras "paralisantes", como o consenso obrigatório. Mas foi bombardeada pelos que argumentavam levar esse caminho aos mesmos impasses para estabelecer regras válidas em todos os cantos.

Para complicar tudo, já estamos atrasados no tempo, como demonstraram em Copenhague o presidente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) e Prêmio Nobel, Rajendra Pashauri, e vários diretores do IPCC, lembrando o aval que dão a seus diagnósticos mais de 90 mil cientistas no mundo todo. Simplesmente transferir as decisões para a COP 16, no México, em dezembro de 2010, apenas contribui para agravar o problema, não para solucioná-lo. Estão diante dos olhos os números crescentes de vítimas dos eventos climáticos "extremos" em toda parte, inclusive no Brasil. Um imenso cartaz num saguão do aeroporto da capital dinamarquesa, colocado por uma ONG, já antecipava 2020, com um presidente Lula de barba e cabelos totalmente brancos se explicando: "Desculpem-me", estava escrito no papel. "Não conseguimos reduzir as emissões até 2020." E seguia dizendo que as primeiras vítimas eram dos países-ilha, que não contribuíram para o problema, e das nações pobres, que quase nada emitiram.
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