Opinião

Complexa transição

Pedro S. Malan
"A eleição de 2010 não pode se fazer em torno das pobres alternativas de ou voltar ao passado ou dar continuidade a Lula. A discussão precisa incorporar os horizontes do século 21 e a superação dos problemas que certamente restarão do seu governo." A pertinente observação é do ilustre ex-ministro Delfim Netto (Folha de S.Paulo, 11/11).


Sobre o século 21, um respeitado historiador inglês, Hobsbawm, observou que este teria começado com cerca de uma década de antecedência: "o breve século 20" teria tido seu tardio início com a Grande Guerra de 1914 e terminado com os eventos do início dos anos 90. Tais eventos parecem dar razão a Hobsbawm: a queda do Muro de Berlim e a reunificação da Alemanha; o colapso da URSS e a fragmentação de sua vasta zona de influência em mais de duas dezenas de países; a emergência da China como potência regional e global, após mais de 12 anos de reformas e de integração com a economia mundial; o avanço do processo de integração europeu com o acordo de Maastricht (1991) e a decisão de lançamento do euro ainda nos anos 90; o início das reformas econômicas modernizadoras na Índia; a renegociação da dívida externa do setor público de quase duas dezenas de países "emergentes"; e a transformação dos EUA de país credor do resto do mundo para a posição de devedor, agravada a partir de 1991, quando passou a incorrer em déficits crescentes em seu balanço de pagamentos.

Em seu conjunto, esses fatores levaram a uma expressiva redução da aversão ao risco e à uma extraordinária ampliação das oportunidades de comércio e investimento, doméstico e internacional, em áreas que passavam a se integrar à economia global. Adicionalmente, avanços tecnológicos nas áreas de informática e telecomunicações propiciaram antes impensáveis reduções de custo e aumentos de produtividade. E permitiram que, ao longo dos últimos 20 anos, centenas de milhões de pessoas passassem a ter acesso, em tempo real, a informações sobre eventos correntes, e sobre padrões de consumo, níveis de renda e riqueza, estilos de vida em outros países, levando a uma revolução de expectativas de milhões de recém-integrados à economia global.

Do ponto de vista econômico-estrutural, portanto, Hobsbawm estava certo: parece ter ocorrido uma reacomodação de placas tectônicas na economia mundial por volta do início dos anos 90, gerando um período sem precedentes de expansão da economia global, do comércio internacional (volumes e preços) e dos fluxos internacionais de capitais privados. Um ciclo de expansão global que, como notou Ken Rogoff, foi "o mais intenso, o mais longo e o mais amplamente disseminado da história moderna" - e cujo auge, é ainda Rogoff quem nota, foi alcançado no quinquênio 2003-2007 (algo que o lulo-petismo faz questão de ignorar). Auge de exuberância que, sabe-se bem hoje, contribuiu em boa medida para a grande crise global de 2008-2009, cujas consequências ainda se estarão fazendo sentir por alguns anos à frente.
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