Opinião

O novo nacionalismo econômico

Editorial do Estadão
Nenhum país sairá vitorioso de uma guerra global de comércio, mas o nacionalismo econômico avança dia a dia, alimentado pela crise nos principais mercados, pela ameaça do desemprego e pela truculência política. Nos anos 30, o protecionismo e as práticas desleais de comércio ajudaram a transformar uma recessão em depressão. Essa experiência tem sido evocada por vozes sensatas e respeitáveis, e o ressurgimento desse nacionalismo, como um espectro assustador, é o tema principal da revista britânica The Economist nesta semana. Mais uma vez, segundo a revista, os Estados Unidos podem contribuir para evitar o desastre, mas isso dependerá da visão política e da capacidade de ação do presidente Barack Obama.

A ameaça protecionista mais visível, neste momento, é a cláusula buy american acrescentada ao pacote de estímulo fiscal enviado pelo Executivo ao Congresso dos Estados Unidos. Segundo a primeira versão dessa cláusula, uma empresa envolvida em obras de infraestrutura ficaria sem acesso aos benefícios tributários se usasse ferro e aço importados. Houve protestos no exterior. No Senado, a cláusula foi amaciada: a condição só será aplicada quando não afetar países signatários do Acordo de Compras Governamentais. Essa ressalva não protege Brasil, China e Índia e outros países não signatários. Em princípio, preserva os interesses da União Europeia, mas empresários e políticos europeus, desconfiados, continuam protestando. O Senado deveria ter eliminado aquele dispositivo, disse o diretor-geral do Eurofer, o principal lobby siderúrgico europeu, Gordon Moffat. Se o Congresso aprovar o texto nessas condições, a tarefa de eliminar o item protecionista ficará para o presidente Obama.

Mas, enquanto outros governantes denunciavam o projeto americano, o presidente da França, Nicolas Sarkozy, anunciava o plano de um novo pacote fiscal, com benefícios para o setor automobilístico. O plano foi apresentado como estímulo às indústrias para se manter no país. Mas pode ser algo mais que isso. Pelas primeiras informações, o governo espera, em troca, que as empresas não desloquem empregos e produção para o exterior. Isso pode incluir, segundo fontes do governo, o compromisso formal de só comprar componentes no mercado interno.

Se essas condições forem confirmadas, o pacote francês imporá restrições ao comércio e à saída de investimentos. Esta é outra face do novo nacionalismo econômico: tende a afetar a circulação não só de bens e serviços, mas também de capital.

Na Espanha, o ministro da Indústria, Comércio e Turismo, Miguel Sebastián, recomendou a compra de mais produtos nacionais. Isso ainda não é um ato protecionista formal, mas o protecionismo, têm advertido especialistas, crescerá impulsionado também por gestos ainda compatíveis com as normas internacionais. Essas ações formalmente legais incluem também, por exemplo, recomendações aos bancos para darem prioridade aos clientes nacionais e as manifestações contra trabalhadores imigrantes. No Reino Unido, por exemplo, está nas ruas uma campanha contra o emprego de trabalhadores estrangeiros nas indústrias locais.

Há uma semana, ministros encarregados de comércio, reunidos em Davos, na Suíça, alertaram o mundo para o perigo do protecionismo crescente. Na última quinta-feira, nova advertência partiu dos chefes da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, da Organização Mundial do Comércio, da Organização Internacional do Trabalho, do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial. "Todos os países têm o dever de resistir a tendências protecionistas", está escrito no manifesto, firmado também pela primeira-ministra da Alemanha, Angela Merkel, anfitriã do encontro.
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