Opinião
O estilo Dilma no caso do mínimo
O Estado de S.Paulo - Editorial
A decisão da presidente Dilma Rousseff de declarar encerradas as negociações com as centrais sindicais e os partidos da base sobre o reajuste do salário mínimo de 2011 - fincando pé no valor fixado de R$ 545 - é uma demonstração de autoridade e coerência política. Não é pouca coisa para quem tem léguas a percorrer na construção de um estilo de liderança pessoal que resgate a sua imagem da sombra do seu padrinho e grande eleitor Luiz Inácio Lula da Silva. De mais a mais, ela está certa em se manter fiel à regra acertada com os sindicalistas em 2007, pela qual o mínimo deve ser reajustado por uma fórmula que leva em conta a taxa de inflação do ano anterior e a variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. Primeiro, porque os pactos existem para ser cumpridos e também disso depende a reputação de um governo. Segundo, porque um aumento maior do que o resultante daquele cálculo desmoralizaria na primeira curva do caminho os reiterados compromissos da presidente com o "valor absoluto" da estabilidade econômica e com o rigor fiscal por ela prometido já no seu pronunciamento da vitória, em 31 de outubro. Afinal, os benefícios da Previdência são reajustados pelo salário mínimo.
A majoração do piso de R$ 510 para R$ 545 não proporciona ganho real para os assalariados, pela simples razão de que o PIB não cresceu no recessivo ano de 2009 (a rigor, retrocedeu 0,2%). Para fazer bonito diante da arquibancada, a presidente poderia, como pleiteavam os sindicatos, sacar a descoberto, antecipando uma parte do robusto aumento que virá em 2012, graças ao desempenho da economia no ano que passou, concedendo um mínimo de R$ 580. Mas Dilma, em mais de uma frente de atuação, parece menos preocupada em fazer bonito do que em fazer a coisa certa. Nem sempre conseguirá, às vezes nem tentará, mas ela decerto está ciente do que poderia significar um recuo já na primeira batalha do seu mandato. Para não deixar dúvidas sobre o que esperar dela, quando está convencida de que a sua posição é a correta, a presidente não só mandou avisar que não há mais o que discutir sobre o mínimo, como ainda tratou de apressar a votação da matéria - o que deverá ocorrer já no começo da semana que vem - e avisou os líderes parlamentares governistas de que emendas ao projeto não serão toleradas. A direção do PT, por sua vez, estuda fechar questão em torno da proposta para enquadrar os companheiros recalcitrantes.
Se, apesar de tudo e contra todas as expectativas, o Congresso aprovar um mínimo superior a R$ 545, o Planalto advertiu que a diferença será compensada por um golpe de tesoura maior do que o previsto no Orçamento, alcançando em primeiro lugar as preciosas emendas parlamentares. Dilma bateu o martelo um dia depois de Lula, na sua primeira manifestação sobre uma questão do governo de sua sucessora, considerar "oportunismo" a insistência dos sindicalistas em alterar as regras do jogo. O ex-presidente foi instado a falar pelos jornalistas que o acompanharam a Dacar, no Senegal, para a abertura do 11.º Fórum Social Mundial. Mas a decisão de Dilma estava tomada de antemão - e não dependia do beneplácito do padrinho. A crítica de Lula caiu mal entre os dirigentes sindicais. Na semana passada, alguns invocaram o seu nome para constranger a presidente que, segundo eles, estaria se desviando da rota do seu mentor. O mais vociferante tem sido o deputado Paulo Pereira da Silva, do PDT paulista, que controla a Força Sindical. "O Lula está com problema de memória", atacou, invocando as promessas do então presidente às lideranças sindicais, em meados de outubro, de que haveria aumento real do mínimo em 2011. À época, o tucano José Serra insistia em que, se eleito, o piso iria para R$ 600.
Além de exprimir seu desapontamento com Lula, os sindicalistas passaram a fazer ameaças rombudas a Dilma. "Derrotar aliados é uma coisa ruim. Fica um rescaldo para o futuro", disse Pereira da Silva. Mas as consequências, além de virem sempre depois, como diria o Conselheiro Acácio, podem ser tanto menores quanto maior a coragem exibida no embate pela autoridade que as sofreria.
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O Estado de S.Paulo - Editorial
A decisão da presidente Dilma Rousseff de declarar encerradas as negociações com as centrais sindicais e os partidos da base sobre o reajuste do salário mínimo de 2011 - fincando pé no valor fixado de R$ 545 - é uma demonstração de autoridade e coerência política. Não é pouca coisa para quem tem léguas a percorrer na construção de um estilo de liderança pessoal que resgate a sua imagem da sombra do seu padrinho e grande eleitor Luiz Inácio Lula da Silva. De mais a mais, ela está certa em se manter fiel à regra acertada com os sindicalistas em 2007, pela qual o mínimo deve ser reajustado por uma fórmula que leva em conta a taxa de inflação do ano anterior e a variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. Primeiro, porque os pactos existem para ser cumpridos e também disso depende a reputação de um governo. Segundo, porque um aumento maior do que o resultante daquele cálculo desmoralizaria na primeira curva do caminho os reiterados compromissos da presidente com o "valor absoluto" da estabilidade econômica e com o rigor fiscal por ela prometido já no seu pronunciamento da vitória, em 31 de outubro. Afinal, os benefícios da Previdência são reajustados pelo salário mínimo.
A majoração do piso de R$ 510 para R$ 545 não proporciona ganho real para os assalariados, pela simples razão de que o PIB não cresceu no recessivo ano de 2009 (a rigor, retrocedeu 0,2%). Para fazer bonito diante da arquibancada, a presidente poderia, como pleiteavam os sindicatos, sacar a descoberto, antecipando uma parte do robusto aumento que virá em 2012, graças ao desempenho da economia no ano que passou, concedendo um mínimo de R$ 580. Mas Dilma, em mais de uma frente de atuação, parece menos preocupada em fazer bonito do que em fazer a coisa certa. Nem sempre conseguirá, às vezes nem tentará, mas ela decerto está ciente do que poderia significar um recuo já na primeira batalha do seu mandato. Para não deixar dúvidas sobre o que esperar dela, quando está convencida de que a sua posição é a correta, a presidente não só mandou avisar que não há mais o que discutir sobre o mínimo, como ainda tratou de apressar a votação da matéria - o que deverá ocorrer já no começo da semana que vem - e avisou os líderes parlamentares governistas de que emendas ao projeto não serão toleradas. A direção do PT, por sua vez, estuda fechar questão em torno da proposta para enquadrar os companheiros recalcitrantes.
Se, apesar de tudo e contra todas as expectativas, o Congresso aprovar um mínimo superior a R$ 545, o Planalto advertiu que a diferença será compensada por um golpe de tesoura maior do que o previsto no Orçamento, alcançando em primeiro lugar as preciosas emendas parlamentares. Dilma bateu o martelo um dia depois de Lula, na sua primeira manifestação sobre uma questão do governo de sua sucessora, considerar "oportunismo" a insistência dos sindicalistas em alterar as regras do jogo. O ex-presidente foi instado a falar pelos jornalistas que o acompanharam a Dacar, no Senegal, para a abertura do 11.º Fórum Social Mundial. Mas a decisão de Dilma estava tomada de antemão - e não dependia do beneplácito do padrinho. A crítica de Lula caiu mal entre os dirigentes sindicais. Na semana passada, alguns invocaram o seu nome para constranger a presidente que, segundo eles, estaria se desviando da rota do seu mentor. O mais vociferante tem sido o deputado Paulo Pereira da Silva, do PDT paulista, que controla a Força Sindical. "O Lula está com problema de memória", atacou, invocando as promessas do então presidente às lideranças sindicais, em meados de outubro, de que haveria aumento real do mínimo em 2011. À época, o tucano José Serra insistia em que, se eleito, o piso iria para R$ 600.
Além de exprimir seu desapontamento com Lula, os sindicalistas passaram a fazer ameaças rombudas a Dilma. "Derrotar aliados é uma coisa ruim. Fica um rescaldo para o futuro", disse Pereira da Silva. Mas as consequências, além de virem sempre depois, como diria o Conselheiro Acácio, podem ser tanto menores quanto maior a coragem exibida no embate pela autoridade que as sofreria.
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