Opinião

A Venezuela em crise

Editorial do Estadão
A Venezuela está diante da sua mais grave crise econômica desde 1998, quando o caudilho Hugo Chávez assumiu o poder. Atingida, em setembro de 2008, pela crise internacional, quando já estava combalida por uma administração ruinosa e pela queda drástica dos preços do petróleo, o país entrou em recessão, tendo o seu PIB acusado uma retração de 2,8% no ano passado. O país vive uma crise energética de proporções inéditas, com frequentes apagões, há escassez de produtos essenciais nos supermercados e os programas sociais do governo, base de sua sustentação política, estão à beira do colapso. As reservas da Venezuela estão em US$ 34,2 bilhões, nível que dificulta a distribuição de benesses aos regimes amigos do peito, adeptos do "socialismo no século 21".

Em uma tentativa de contornar a crise, o coronel Chávez decidiu, na sexta-feira, desvalorizar a moeda nacional, o bolívar forte. A moeda, que pela cotação oficial valia 2,15 por dólar saltou para 2,60 para a importação de bens essenciais de consumo. Para a aquisição no exterior de bens supérfluos, como automóveis e produtos eletrônicos, a cotação passou para 4,30 por dólar. Esse tipo de câmbio duplo tem uma nuance: a taxa de 4,30 bolívares por dólar também é aplicável às exportações do país, altamente concentradas no petróleo. Isso atenuará a penúria de recursos do governo. Chávez, aliás, já determinou que o Banco Central transfira US$ 7 bilhões de suas reservas para o Fundo de Desenvolvimento Nacional (Fonden). Durante 2009, já haviam sido transferidos cerca de US$ 12 bilhões para esse fundo, cujos recursos podem ser livremente utilizados por Chávez na promoção do "socialismo do século 21".

Com o dólar sendo negociado no câmbio negro a 6 ou 7 bolívares, o governo não tinha escapatória senão desvalorizar a moeda, embora sabendo que isso irá afetar as classes de mais baixa renda, uma vez que a Venezuela importa cerca de 80% dos alimentos que consome.

A reação popular à desvalorização foi a previsível. Anunciada a depreciação da moeda, multidões invadiram as lojas, comprando tudo o que pudessem carregar. A população receava ter de enfrentar, além da escassez, um aumento brutal dos preços das mercadorias. A reação de Chávez foi convocar a Guarda Nacional e as milícias populares para "lutar contra os especuladores".

É possível que o governo venha a criar novas formas de subsídio aos gêneros de primeira necessidade para acalmar os ânimos, além de reforçar o tabelamento de preços, que já estava levando ao desabastecimento. Seja como for, a inflação anual oficial, que anda ao redor de 25% ? a inflação real passa dos 30% ?, deve ter um acréscimo de 5 pontos porcentuais, segundo os analistas. Uma inflação tão elevada decerto agravará ainda mais a crise, prejudicando a produção e sacrificando a população.

Quanto aos bilhões destinados ao Fonden, a sua eficácia é extremamente duvidosa. Não só por questões relativas à incompetência na gestão de recursos e à corrupção da claque que cerca o caudilho, e que só se avoluma com a expropriação de bancos, indústrias e até mesmo de estabelecimentos comerciais. Os casos de corrupção têm sido tantos e de tal monta que Hugo Chávez se viu obrigado a afastar ou a prender alguns de seus companheiros. Mas, além disso, falta planejamento ou definição de objetivos claros a atingir. Grande parte dos recursos do Fonden, como de hábito, será certamente desviada para o empreguismo e aumento dos salários do funcionalismo, para o financiamento das extravagâncias da política externa bolivariana e para garantir o sucesso dos candidatos de Chávez nas eleições parlamentares deste ano.
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