Opinião

Lula e os estragos do decreto

Editorial do Estadão
O presidente Lula voltou a Brasília, depois das férias, com o objetivo imediato de acabar com a briga entre ministros, pôr ordem na casa e cuidar dos estragos causados pelo infeliz decreto sobre o Programa Nacional de Direitos Humanos, assinado por ele mesmo em 21 de dezembro. Pelo menos um erro o presidente reconheceu: não se deveria ter incluído no texto a proposta de revogação da Lei da Anistia, de 1979. Melhor deixar o assunto para o Judiciário, porque a lei já foi contestada pela Ordem dos Advogados do Brasil e o Supremo Tribunal Federal deverá julgar a ação neste ano. Mas o erro foi cometido em várias etapas.


A primeira contribuição foi do secretário Nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, responsável pelo texto original do decreto. A segunda foi da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Era sua obrigação desarmar a bomba e prevenir o presidente. A terceira, e conclusiva, foi do próprio Lula, ao assinar o papel.

Atribuem-lhe a declaração de que assinou sem ler. Pode ser verdade. Mas pode ser também que o tenha lido sem pensar nas consequências. A segunda hipótese parece improvável, porque o decreto tem 92 páginas e o presidente, como se sabe, é avesso à leitura. Mas isso não o isentaria de responsabilidade.

O fato é que ele escorregou mais de uma vez. Um de seus enganos foi confiar na atenção e na qualidade do julgamento da ministra-chefe da Casa Civil, sua candidata à Presidência. Se eleita, ela talvez tenha mais sorte que Lula na escolha da figura mais importante do gabinete - alguém capaz de ler e de avaliar os documentos entregues para o chefe assinar.

Mas o presidente ainda pode evitar maiores danos. Se eliminar o revanchismo embutido no decreto, poderá acomodar a situação com os comandantes militares e livrar o ministro da Defesa, Nelson Jobim, de uma situação muito desconfortável. Com isso, talvez tenha de aceitar a demissão de seu secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, mas isso será um bônus, não um custo.

Sobrariam, no entanto, outros problemas. O revanchismo e a tentativa de revogação da Lei da Anistia são apenas uma das várias fontes de conflito reunidas no decreto. Na sexta-feira, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, criticou o texto assinado por Lula. O documento, segundo ele, é preconceituoso em relação à agricultura de mercado, principal suporte do superávit comercial e da estabilidade de preços.

Na sua opinião, as mudanças legais propostas pelo decreto deverão aumentar "a insegurança jurídica no campo". Quanto a isso, não podem pairar dúvidas. O decreto defende, entre outras aberrações, um exercício de mediação entre invasores e vítimas de invasão de propriedades, antes da decretação, pelo juiz, da reintegração de posse. Invasão ainda é crime e invasores não podem ter o mesmo status legal de suas vítimas, mas o autor do texto parece desconhecer ou desprezar esse e outros detalhes. O mesmo decreto propõe subordinar ao assembleísmo de organizações "populares" as decisões de aumento de plantio de várias culturas de grande importância comercial para o País.
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