Livros

Hemingway em Cuba

Norberto Fuentes
Havia projeções privadas de filmes no Finca Vigía. Entre os espectadores estavam os visitantes assíduos da casa: o médico Herrera Sotolongo e seu irmão Roberto, Sinsky, o padre Dom Andrés e alguns outros. Se esparramavam sobre as poltronas da sala e um projetor de 16 mm lançava suas imagens sobre a tela.
Hemingway alugava o material de diversas companhias distribuidoras. Quase sempre eram documentários sobre boxe. Tinha um que lhe interessava particularmente: mostrava a luta de Rocky Graziano e Tony Zalet, pelo campeonato mundial dos pesos médios, celebrada em Nova Iorque no dia 27 de setembro de 1946 (uma das três que disputaram nessa época, entre 1946 e 1949). “Muito boa luta” comentava Hemingway em espanhol.
Em certa ocasião conseguiram da embaixada norte-americana a série completa de Vitória no Mar, que narra as operações navais norte-americanas no Pacífico durante a Segunda Guerra Mundial. É uma excelente série de vinte capítulos, de uma hora de duração cada um, realizado com material filmado por cinegrafistas da Marinha norte-americana. Mas havia uma cena que chamava a atenção de Hemingway. Projetou-a uma e outra vez e ordenara que se parasse o projetor num determinado quadro: numa das ilhotas do Pacífico, os marines conquistaram a vitória. E a defesa japonesa é quase nula. Há um bunker, que já não oferece resistência. Os japoneses se vêem obrigados a sair de sua prisão de concreto. Lá fora, um sargento dos marines espera pelos japoneses com um lança-chamas na mão, e os “fuzila” um por um, queimando-os vivos. A cena foi filmada de trás do sargento. A cada tanto ele dá a volta e sorri para a câmera.
- Eu duvido que esta cena apareça em todas as cópias de Vitória no Mar – afirmava Hemingway.
- Rapazes – perguntou uma vez o padre Dom Andrés -, por que param sempre nesta bendita cena?
- Juramos matar esse cara onde quer que a gente o encontre – explicou o médico Herrera Sotolongo. Ernesto quer que a gente guarde o seu rosto na memória.

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