Opinião

Esquerda derrota Sarkozy

Editorial do Estadão
O eleitorado francês - ou melhor, a metade que se abalou a votar no segundo turno da disputa pelos governos regionais do país, domingo passado - infligiu ao presidente Nicolas Sarkozy uma derrota que excedeu as suas previsões mais pessimistas. As pesquisas já vinham indicando que o partido de Sarkozy, a União por um Movimento Popular (UMP), de centro-direita, pagaria nas urnas pela insatisfação generalizada dos franceses com os projetos de reformas econômicas e sociais do presidente, quando o desemprego, passando de 10%, é o maior entre os principais países da União Europeia (e também ligeiramente superior ao dos Estados Unidos). Mas não se supunha que o protesto seria tão contundente.

Das 26 regiões em que o país foi dividido pela reforma administrativa de 1986 - 22 das quais na França continental -, a UMP só conseguiu vencer em 3: Alsácia, Guiana Francesa (na fronteira com o Brasil) e Ilhas Reunião (no Oceano Índico). As demais escolheram candidatos do Partido Socialista. E nenhum dos 20 ministros que se candidataram à presidência de alguma região conseguiu se eleger. Há três anos, quando Sarkozy superou por 53% a 47% a socialista Ségolène Royal na eleição nacional, tornando-se o primeiro candidato desde 1974 a chegar ao Palácio do Eliseu na tentativa inicial, os jornais e as mesas-redondas na televisão francesa se encheram de necrológios sobre o crepúsculo inexorável da esquerda.

Como diria o escritor americano Mark Twain, ao deparar com a notícia de que havia morrido, o prognóstico era "ligeiramente exagerado". Desta vez, nas urnas regionais, os socialistas deram o troco aos céticos e aos seus adversários históricos. Colheram 54% dos votos, ante apenas 36% obtidos pelo partido do presidente. Típico sintoma da malaise econômica francesa, a extrema-direita também ressurgiu das cinzas, embora em escala bem mais modesta. A xenófoba Frente Nacional, agora liderada por Marine Le Pen, filha do seu fundador, Jean-Marie, reuniu 8% dos sufrágios. A grande surpresa foi a ascensão dos verdes. Com os seus 13%, o partido ambientalista Europe Ecologie firmou-se como a terceira força política do país.

Embora não se deva incidir na mesma avaliação precipitada de 2007 sobre o definhamento inexorável dos socialistas, o que equivaleria a apostar que Sarkozy não se reelegerá em 2012, cedendo a cadeira à já declarada candidata Ségolène, presidente da região de Poitou-Charentes, não há duvida sobre qual foi a chamada mensagem das urnas no pleito regional. O destino das localidades, em si, tem escassa ou nenhuma importância para a grande maioria dos franceses, dada a sua baixa autonomia. Segundo uma pesquisa recente, não chega a 30% deles os que sabem o nome do presidente de sua região. Para os eleitores que ainda não se desencantaram de todo com a política, essas disputas geralmente oferecem uma oportunidade de mostrar o punho ao governo central.

Motivos, decerto, sempre haverá, ainda mais agora. Apesar do elevado desemprego, a economia francesa suportou razoavelmente a crise, em comparação com os vizinhos. O PIB recuou 2,1% no ano passado, mas, no último trimestre, indicando que a recuperação se iniciara, o resultado foi 0,6% positivo (ante, por exemplo, a estagnação alemã no mesmo período). No entanto, como já se observou, em tempos de vacas magras, a circunstância de que a desgraça alheia é maior não serve de consolo. Ao mesmo tempo, o desfile do midiático Sarkozy como salvador da indústria nacional parece cada vez menos convincente. O retrospecto das demissões e fechamentos de fábricas erodiu a credibilidade do presidente. Apenas 42% dos concidadãos o consideram "eficiente".
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