Um dia para esquecer...



A Amendoeira da Avenida Iperoig – Um ano depois

Em dezembro de 2005, um pouco antes do Natal, um e-mail anônimo, circulou nas revistas virtuais, dando conta de que – na calada da noite – uma das amendoeiras centenárias da Av. Iperoig seria suprimida, para que a estrutura de cobertura da “Feira Ripe”, travestida em um “centro de convivência” (um elefante branco de mais de oitenta metros de comprimento, por quase quatorze metros de altura) pudesse ser erigida no local.
Houve mobilização de populares, no sentido de se efetuar um “empate” (assistam a mini-série da Globo para entender do que se trata), de forma a impedir o corte da amendoeira. Na verdade, o que ocorreu foi quase um enfrentamento, pois o número de feirantes que se mobilizaram para impedir àquela manifestação mostrou o quanto a obra interessava aos mesmos.
Naquela época, procurei os webeditores Sidney Borges e Luiz Moura, para buscar obter maiores informações sobre o assunto, mas, naquele momento, o que se divulgava era que a construção não atingiria nenhuma árvore, que haveria um arranjo para que a amendoeira fosse mantida.
Não confiando neste “arranjo e na tentativa de impedir o pior, a ADPC – Associação de Defesa do Povo Caiçara – impetrou uma Ação de Obrigação de Não Fazer, com Pedido de Medida Liminar, de forma a preservar as amendoeiras que, junto com o Cruzeiro, constituíam paisagem notável e histórica no município. A referida liminar foi concedida no final de dezembro de 2005, pelo então juiz substituto da 2.ª Vara Cível da Comarca.
De forma a retomar as obras a qualquer custo, a Prefeitura ingressou com um Pedido de Reconsideração, visando derrubar a Medida Liminar concedida pela Justiça. Este Pedido de Reconsideração embasava-se em um laudo, que afirmava que a referida amendoeira estava doente e que oferecia risco à população do local.
Em 04 de janeiro de 2006, a Medida Liminar foi suspensa e, horas depois, sem tempo para qualquer reação, sequer de se solicitar que fosse feito um laudo independente, a amendoeira foi derrubada e removida por máquinas e equipamentos da Prefeitura, de forma mal planejada, às pressas, sem seguir nenhum dos procedimentos básicos necessários quando da retirada de uma árvore para transplante.
Dias depois, as obras continuavam a todo o vapor. O histórico Cruzeiro, passou a ter escavações em todo o seu redor. Populares se mobilizaram, temendo que o mesmo fosse derrubado para dar lugar a mais uma das sapata da cobertura da “feirinha RIPE” e, novamente a ADPC, ingressou em juízo de forma a impedir que mais um marco do município fosse arrancado. Desta feita, foi concedida liminar sustando as obras, pela juíza da 1.ª Vara Cível, de forma a preservar o histórico monumento.
O resto da história todos conhecem. A amendoeira, que o laudo afirmava que estava “doente” e que oferecia riscos à população foi replantada em uma praça do Perequê-Açu. Estava tão forte e hígida, que aguentou um transplante mal feito, mal planejado e continuou viva, para a tristeza de muitos.
O Cruzeiro está de pé (continua mal conservado e mal iluminado) e ressente-se da falta da ambiência que a amendoeira arrancada lhe oferecia. Mas está lá, resiste. É um marco da resistência caiçara, da tradição. Um dia, ao invés de tentar derrubá-lo, haverá políticos e administradores que, em nome da história, lhe promoverão uma reforma (que incluirá o transplante da amendoeira), criando no local um conjunto de equipamentos que permitam aos visitantes e aos munícipes conhecer um pouco mais das raízes da nossa cidade.
Hoje, uma Ação Civil Pública, muito mais completa e complexa, de autoria do MDU – Movimento de Defesa de Ubatuba, que abarcou a ação inicial da ADPC, está em curso, na defesa do nosso patrimônio, de nossa história e de nossas tradições.
As obras da “feirinha RIPE”? Estas continuam embargadas.

Ilustração: Poema concreto de Sidney Borges em homenagem aos irmãos Campos

Marcelo Mungioli

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