Opinião

Da crise ao caos no Senado

Editorial do Estadão
Em um intervalo da reunião do Gabinete do presidente Lula, na segunda-feira, o coordenador político do Planalto, ministro José Múcio Monteiro, transmitiu à imprensa o que seria o diagnóstico do governo sobre a crise do Senado - "instalada, mas em processo de superação". Era o que lhe competia propagar e é nesse desfecho que Lula investe os seus recursos de mando, quanto mais não seja porque ele se atrelou para o que der e vier ao seu parceiro José Sarney, o sitiado presidente de uma Casa em processo de desagregação. Lula decerto aposta que a sua popularidade o autoriza a assumir a irrestrita defesa de uma figura que hoje em dia encarna como ninguém o vicioso poder oligárquico na política nacional e, nessa condição, é alvo de denúncias devastadoras que ecoam amplamente na opinião pública.

Ainda na reunião ministerial, Lula exortou a sua equipe a cerrar fileiras em torno de quem ele é devedor por serviços prestados no transe do mensalão e com quem conta para unir o PMDB à candidatura Dilma Rousseff no próximo ano. "É importante ser leal a Sarney", comandou, "porque há uma campanha pesada contra ele e não se pode individualizar as acusações." Estas palavras abrigam uma falsidade e um despropósito - até aí nenhuma novidade, considerando o repertório do autor, embora a contumácia apenas acentue o seu cinismo. O que ele quer que se considere campanha nada mais é que uma sequência pesada, sem dúvida, mas de fatos objetivos que a imprensa desentranhou e que só agravaram a situação do seu protagonista nas raras vezes em que tentou contestá-los.

Em uma incursão pela quase-lógica, o presidente se queixa de que o seu aliado teria sido escolhido para pagar pelos escândalos no Senado. Não seria justo cobrar de Lula conhecimentos de filosofia do direito, mas a inexistência de culpas coletivas é princípio elementar de Justiça. Quantos tenham sido os senadores envolvidos com as malfeitorias expostas, cada qual será individualmente responsável pela parte que lhe tocou na esbórnia continuada - na implausível hipótese de que sejam chamados a pagar por ela. De resto, desabou sobre Sarney um problema que não guarda relação direta com os seus três mandatos de presidente da instituição e sua preeminência entre os seus pares, como as nomeações de parentes e apaniguados, uso de servidores para fins particulares e recebimento indevido de auxílio-moradia.

É a mentira que proferiu em plenário para negar a sua responsabilidade estatutária pelas decisões da fundação que leva o seu nome e da qual foram desviados R$ 500 mil do R$ 1,3 milhão obtido da Petrobrás a título de patrocínio cultural. Para tirar do foco a conduta que configura inequívoca quebra de decoro parlamentar - em 2000, o senador Luiz Estevão (PMDB-DF) foi cassado porque mentiu no caso do Fórum Trabalhista de São Paulo -, Sarney resolveu transformar o seu desastre pessoal numa catástrofe administrativa para o Senado. De supetão e à revelia da Mesa, anunciou demagogicamente a anulação de todos os 663 atos secretos assinados desde 1995 pelo então diretor-geral Agaciel Maia, seu apadrinhado, para criar cargos, nomear, demitir, contratar, engordar salários e distribuir mordomias.
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