Circo da Notícia

A hora dos panos quentes

Por Carlos Brickmann no Observatório da Imprensa (original aqui)
A revelação, algumas horas antes da abertura dos envelopes, das empresas de publicidade ganhadoras da concorrência da Petrobras, é exemplar por vários motivos. Primeiro, por ter ficado claro, mais uma vez, que o sistema de concorrência pública no Brasil ainda tem furos que permitem o favorecimento de grupos menos competentes ou mais careiros; segundo, porque a Petrobras levou alguns dias para cancelar a concorrência, quando deveria tê-lo feito imediatamente, tão logo se verificou a irregularidade. Terceiro, por ter mostrado que a imprensa, se foi capaz de repercutir a informação de uma revista eletrônica, a Meio&Mensagem Online, não teve fôlego para ir mais longe.

Ou, pior ainda, não teve fôlego para ir mais longe nem imaginação para buscar novas pautas a respeito de um tema tão escabroso. Por que, por exemplo, a Petrobras demorou tanto para cancelar a concorrência, se era público e notório que havia pelo menos uma irregularidade insanável? Qual o perfil das agências que ganharam a concorrência antes da abertura dos envelopes? Qual o relacionamento já existente entre elas e a Petrobras? Como é que uma empresa multinacional, que há pouquíssimo tempo deixou de ser um braço de sua sócia brasileira, de repente ganhou músculos para derrotar concorrentes com muito mais tradição no mercado? E, a partir daí, por que não verificar se nos estados, governados seja por que partido forem, as regras das concorrências têm as mesmas falhas?

Num ano eleitoral, e havendo envolvimento de uma empresa-símbolo do país, como a Petrobras, há o risco de partidarizar as investigações. Isso deve ser evitado: envolvimento partidário só se ficar comprovado que os partidos têm conhecimento das irregularidades, se beneficiam delas, participam da fraude.
Fraude, a propósito, é a palavra que deve nortear as coberturas. Se o resultado da concorrência era conhecido antes da abertura dos envelopes, houve fraude; alguém buscou, por algum motivo, controlar o resultado da concorrência. É difícil de apurar, mas se alguém o conseguir terá uma excelente reportagem nas mãos.

Jornalismo bonzinho


Aquela história de que os bancos só lhe emprestam dinheiro quando você não precisa continua válida; e a cada dia vale para mais setores da economia. Seguro saúde, por exemplo: à medida que o cliente envelhece (e tem sua capacidade de ganho reduzida), as seguradoras apertam mais a corda no seu pescoço, punindo-o pela ousadia de não morrer tão cedo quanto suas estatísticas estimavam.

Mas há abusos bem menos sofisticados do que esse. Uma jovem que mora em São José dos Campos (SP), associada à Unimed Paulistana, precisa fazer uma biópsia no seio – coisa urgente, já que se for problema sério terá de ser tratado imediatamente. A jovem foi à Unimed em São José dos Campos, levando toda a documentação, e nada de receber resposta. Reclamou, e soube que a empresa nem havia encaminhado ainda os documentos à congênere paulistana. Conversou com a Unimed Paulistana e soube que o pedido, quando chegasse, levaria pelo menos três dias para ser analisado. Experimente o caro colega atrasar três dias o pagamento do seguro-saúde (ou, no caso, mais de uma semana, já que houve a retenção em São José dos Campos). O lado de lá do balcão não costuma ter compreensão nenhuma em casos como este.

Resultado (por enquanto): a advogada da jovem registrou boletim de ocorrência na delegacia de polícia e prepara outras providências. E os meios de comunicação? Quietinhos, quietinhos. Não falam sobre problemas sérios, específicos, como este; não falam sobre problemas sérios, crônicos, como o dos aumentos astronômicos para os chatos que insistem em continuar vivos, ousados que são.

Uma amiga deste colunista entrou, há muitos anos, no plano mais caro de um seguro saúde bem conceituado. O seguro quebrou, foi vendido a outro, que quebrou, foi vendido a outra, e o plano dela foi caindo de patamar. Hoje a sede fica fora de São Paulo e o tratamento é analgésico da cintura para cima e elixir paregórico da cintura para baixo. E, embora continuem cobrando pelos planos top, nem os xaropinhos e comprimidos eles estão dando.

Imprensa? Não, isso não vale. Matéria boa é aquela que o promotor já dá pronta, não exige prática nem tampouco habilidade. No máximo, e só para constar, ouvir o outro lado, numa matéria que deverá ser publicada num canto, bem pequenininha. Pesquisar, fazer reportagem? Dá trabalho, e trabalho cansa.


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