Tempo quente

Cabelo, cabeleira, cabeluda, descabelada...

Cabelo com orgulho é crina, cilindros de espessura fina, cabelo quer ficar pra cima, laquê, fixador, gomalina... (Arnaldo Antunes)

Sidney Borges
O calor chegou. Com ele os mosquitos. Com os mosquitos os repelentes. Hoje eu me encontrava ocupado passando um creme branco na pele quando me ocorreu que o cheiro e a consistência lembravam Brilcrem. Tenho forte lembrança desse fixador. Foi lançado na época em que eu não sabia o que fazer com os cabelos. Até um ou dois anos antes minha mãe combinava com o barbeiro:

- Americano curto.

Ele respondia eco - era italiano, no Brás todo mundo era italiano - e raspava tudo. Ou melhor, quase tudo. Deixava uma pastinha sobre a testa. Depois bezuntava com brilhantina e penteava em movimento circular. Nascia o topete. Eu não dava a mínima, saia do salão com cheiro enjoativo e ia jogar bola ou empinar papagaio. Logo o cheiro passava.

Não sei bem precisar o momento da virada em que descobri os cabelos. Certamente coincidiu com a chegada do Brilcrem. Lembro-me bem da músiquinha: Brilcrem, apenas um pouquinho. Brilcrem, você irá brilhar. Brilcrem, é o melhor caminhuuuuuu. Para mil pequenas conquistar.

Pessoas mudam, entrei na fase da aparência. Acho que foram os hormônios. Acreditei na musiquinha e comprei um tubo grande de Brilcrem.

Foi frustrante. Funcionava na televisão, mas comigo não. Meus cabelos finos e revoltos tinha opinião firme, não gostavam de ordem. Ora eu os penteava com risca e topete. Em outras ocasiões para trás.

Qualquer que fosse a opção logo voltavam ao natural, cada um para o seu lado, a maioria para a frente.

Antes do momento Brilcrem brilhantina Glostora foi razoavelmente eficaz. O penteado ficava firme e a cabeça igual a uma mesa envernizada. Se a minha mãe não me obrigasse a tomar banho tenho certeza que o penteado duraria semanas.

Também havia o tradicionalíssimo Gumex, que era vendido em pó com instruções para o preparo. Era mais radical, eu passava Gumex e penteava para trás. Ficava parecendo o Gino, centroavante do São Paulo. Na verdade eu queria ficar parecido com o Mandrake que tinha penteado dos mais elegantes e namorava a princesa Narda. Mas parecer com o Gino não era de todo mau, ele que tinha feito um gol de bicicleta em Portugal e deixado o narrador sem fala.

Mas voltando ao Brilcrem, acho que além de engordurar os cabelos, também espantava mosquitos. Medo de grudar. Em busca da aparência elegante aprendi muito, inclusive que ao serem fixados com Gumex os cabelos ficavam duros como vidro. O mosquito que se atrevesse seria esmagado pelo impacto. Gosto de Gumex, acho que vou usar novemente. Dura lex, sed lex, nos cabelos só Gumex.

Twitter

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu