Editorial

Esperteza tem limites

Rondônia é longe. Muito longe. Para um morador do sul é quase uma abstração. Temos o hábito de não dar a devida importância ao que acontece distante. Dou um exemplo. Dias atrás a televisão mostrou ruas de São Paulo desertas em plena hora de movimento. Cenas de filmes de ficção científica. Para mim, que morei em São Paulo até outro dia, foi surpreendente, mas não causou maior emoção antes que o telefone tocasse e eu ouvisse da boca da minha irmã o que de fato estava acontecendo. Só então me dei conta do significado de uma cidade sem transporte coletivo. Pessoas caminhando no meio de ruas e avenidas, silenciosas, apressadas, aterrorizadas, querendo chegar logo em casa para se sentirem seguras, longe do perigo. Esse clima a televisão ainda não consegue passar. Por mais realistas que sejam as imagens, nosso emocional as entende como abstrações. Talvez um dia isso mude. O sentimento de coisa distante, quase mágica, deve ter sido o das pessoas que viram membros exponenciais dos poderes legislativo e judiciário de Rondônia algemados. É isso mesmo, desembargadores na cadeia. Intocáveis presos. Parece que não estamos no Brasil. Para quem acompanha a política de Ubatuba, cidade onde ainda existe a cultura da impunidade, deve ter sido um alento. Desde que cheguei aqui ouço falar em esquemas infalíveis, que tornaram políticos nitidamente corruptos, pessoas acima do bem e do mal. De fato, tais esquemas existiram. Sei até dos preços. Certo advogado que está na mira da Polícia Federal, amigo íntimo de um ex-poderoso delegado que está preso e protegido do pai desse delegado que é desembargador, cobrava vinte mil reais para resolver “problemas”. Preço para soluções locais. Se a coisa subisse o "queijinho"* dobrava e se fosse para Brasília quintuplicava. Cem mil reais para afastar qualquer tipo de dor de cabeça. O dinheiro que ia para o chicanista saia dos bolsos dos cidadãos. Um superfaturamento aqui, outro acolá e a quadrilha se locupletou durante anos. A moleza acabou ou está em vias de acabar. A Polícia Federal começou a derrubar a farra das sentenças favoráveis quando colocou atrás das grades o juiz federal Rocha Mattos. Aquele que parece cantor de tangos, mas é apenas um marginal infeliz e vaidoso. Com ele foram derrubados mecanismos que funcionaram durante anos e que protegeram gente graúda. Que fique o aviso aos menos precavidos. O cerco está se fechando. A era da impunidade está longe de acabar, mas alguns avanços são notáveis. Muita gente que se acha esperta vai ver o sol nascer quadrado. Estou falando de gente de Ubatuba. Alguém duvida?

* "Queijinho" - Iguaria preferida dos ratos.

Sidney Borges

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu