Ponto de vista

Gaia em perigo

Sidney Borges
Num dia ensolardo e primaveril da década de 1960 o cientista James Lovelock se perguntou: Por que a atmosfera terrestre é propícia à vida e a dos outros planetas do sistema solar como Marte e Vênus, não? A partir desse questionamento simples começou a aflorar uma das idéias mais originais da ciência moderna. Nosso ar “não é meramente um produto biológico”, James Lovelock escreveu. “É mais provável que seja uma construção biológica: uma extensão de um sistema vivo feito para manter um ambiente específico.”
O planeta Terra não é um aglomerado de rochas e água coberto por uma fina camada gasosa, mas um ser vivo capaz de gerar, manter e regular as suas próprias condições de meio-ambiente. Essa é a Hipótese de Gaia ou Teoria de Gaia, nome escolhido para homenagear a deusa grega Gaia.
A conclusão de Lovelock é surpreendente, é a vida da Terra que cria as condições para a sua própria sobrevivência. Inicialmente a ciência tradicional torceu o nariz, mas a Teoria de Gaia foi de pronto adotada por ecologistas, místicos em geral e acabou transformando James Lovelock em uma estrela de primeira grandeza dos movimentos alternativos, o cientista foi elevado à condição de guru espiritual das gerações pós-hippies.


Aquecimento global

No início, ele também não considerou o aquecimento global como uma ameaça urgente ao planeta. “Gaia é uma vagabunda durona”, ele explica com freqüência, tomando emprestada uma frase cunhada por um colega. Mas, há alguns anos, preocupado com o derretimento acelerado do gelo no Ártico e com outras mudanças relacionadas ao clima, ele se convenceu de que o sistema de piloto automático de Gaia está seriamente desregulado, tirado dos trilhos pela poluição e pelo desmatamento. Lovelock acredita que o planeta vai recuperar seu equilíbrio sozinho, mesmo que demore milhões de anos. Mas o que realmente está em risco é a civilização.
A visão de Lovelock não é das mais esperançosas para o homem. Em entrevista recente ao jornalista Jeff Goodell, para a revista Rolling Stone, ele afirmou que até 2020 secas e inundações, acompanhados de furacões, maremotos e terremotos serão comuns no planeta. Até 2040 o Saara vai invadir a Europa e Berlim será tão quente quanto o Ceará. Miami, Rio de janeiro e Londres sofrerão inundações como conseqüências da elevação do nível do mar. A falta de alimentos provocará um verdadeiro êxodo para o norte elevando as tensões políticas. Com as dificuldades de sobrevivência e as migrações em massa, virão as epidemias. Até 2100 a população da Terra encolherá dos atuais 6,6 bilhões para cerca de 500 milhões, sendo que a maior parte dos sobreviventes habitará altas latitudes – Canadá, Islândia, Escandinávia, Bacia Ártica.
Nas proximidades do final do século o aquecimento global fará com que as temperaturas médias da América do Norte e Europa sofram um aumento de 8 graus Celsius - quase o dobro das previsões mais prováveis do relatório mais recente do Painel Intergovernamental sobre a Mudança Climática, a organização sancionada pela ONU que inclui os principais cientistas do mundo.
“Nosso futuro”, Lovelock escreveu, “é como o dos passageiros em um barquinho de passeio navegando tranqüilamente sobre as cataratas do Niagara, sem saber que os motores em breve sofrerão pane”. E trocar as lâmpadas de casa por aquelas que economizam energia não nos salvará. Para Lovelock, diminuir a poluição dos gases responsáveis pelo efeito estufa não vai fazer muita diferença a esta altura, e boa parte do que é considerado desenvolvimento sustentável não passa de um truque para tirar proveito do desastre. “Verde”, ele diz em tom de piada, “é a cor do mofo e da corrupção.
Lovelock sabe que prever o fim da civilização não é uma ciência exata. “Posso estar errado a respeito de tudo isso”, ele admite.
E provavelmente está, dizem cientistas que admitem a problemática do aquecimento global , mas afirmam que a ação do homem é responsável apenas por uma parte do fenômeno. A Terra já viveu outra fases de aquecimento, o fenômeno é cíclico e independe de ações humanas.
Por via das dúvidas, com culpa no cartório ou não, é conveniente à espécie humana colocar as barbas de molho. A vida moderna está consumindo o planeta e se não vai causar a destruição do homem, como afirma Lovelock, está caminhando para tornar a vida difícil e desconfortável. Quem enfrenta os congestionamentos das grandes cidades e lê nos jornais sobre falta de alimentos pode bem avaliar que alguma coisa está errada. O que fazer para mudar esse panorama nada animador? Ainda há tempo?
Desde que passou a advogar a causa da Energia Nuclear, James Lovelock ficou mal na fita de verdes e assemelhados. Ao afirmar que a fissão nuclear é a forma de se produzir energia menos prejudicial ao meio-ambiente entrou em rota de colisão com os ambientalistas, que têm urticária só de ouvir falar em átomos. Ao assumir esse posicionamento controverso James Lovelock foi considerado traidor da causa ambiental e perdeu a aura mística de salvador da pátria. Já não é mais guru. Tomara que esteja errado, no fim do século eu terei 152 anos e quero viver bem a velhice.

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