Coluna da Segunda-feira

Mediação de conflitos

Para os amigos tudo, para os inimigos a lei

Rui Grilo

O conflito é inerente à espécie humana. É uma situação que revela desentendimento, confronto de opiniões, entre duas ou mais pessoas, situação essa que não tem de ser necessariamente negativa, podendo ser um elemento positivo para a transformação da pessoa e da sociedade.

No entanto, o conflito que poderia ser superado pelo diálogo, cada vez mais tem sido judicializado, isto é, sua solução tem sido buscada pelo recurso ao poder judiciário, abarrotando os tribunais. Como conseqüência, a justiça torna-se morosa com um congestionamento de 58% no país e de 74% no Estado de São Paulo, gerando uma crise de legitimidade da justiça. Além disso, é vista como distante, cara e com viés punitivo para a classe pobre. Ao contrário, para a classe rica é um recurso para obtenção de direitos e postergação da aplicação de penalidades.

Os conflitos não resolvidos ou cujo desfecho resultou o poder de um sobre o outro, em que uma das partes não se sente ouvida ou contemplada no seu direito, constitui-se numa violência, levando ao descrédito a própria base da vida social que é a busca de consenso, de contratos aos quais todos devem obedecer, e de direitos que devem ser respeitados e garantidos. O não cumprimento desses acordos leva à barbárie, ou seja, a busca da autoafirmação pela força, pela aplicação da justiça com as próprias mãos, ameaçando a segurança de todos.

Como essa situação não é uma situação natural mas criada pelo homem em sua evolução histórica, aqueles que lutam pela justiça e pela democratização da sociedade, que crêem que essa situação pode se modificada no sentido da maior autonomia de todos e do empoderamento de cada um, buscam por alternativas que ultrapassem essa situação. Uma dessas alternativas é a mediação de conflitos.


Ela se caracteriza pela autocomposição, não adversarial, isto é, não há a necessidade de apresentação de laudos ou provas. Duas ou mais partes em contenda, buscam o auxílio de um terceiro neutro (Mediador), o que requer um autocontrole, pois, diferente do conciliador, não opina, não sugere, não garante os turnos de palavra. Está ali numa atitude de escuta ativa tentando perceber o que é dito e o não-dito, que emoções estão por trás da situação para auxiliá-las a encontrar soluções de ganhos mútuos. Por serem autonegociadas, são mais duradouras devido ao comprometimento entre as partes para se chegar a esses resultados. Devido aos resultados alcançados, está se tornando um tema recorrente em âmbito nacional e internacional, nos mais diferentes campos – empresarial, familiar, escolar, institucional.

Difere da arbitragem porque a solução é decidida pelas partes em conflito e não pelo árbitro. Na mediação não há poder nem coação. Não há a figura do réu e da vítima, substituído pelas figuras do autor e do receptor. A oralidade prevalece sobre a escrita, contribuindo para desarmar os espíritos e colocá-los mais à vontade, o que favorece os mais pobres e com pouco domínio do vocabulário formal. O mediador deve agir como facilitador, sem fazer julgamentos.

O envolvimento com o outro através do diálogo para a solução de um conflito é uma prática educativa que alarga o nível de conhecimento do próprio indivíduo, dando-lhe melhores condições de compreender a diversidade cultural e política, garantindo-lhe uma participação mais esclarecida na sociedade.

Esse foi o tema do 73ª sessão do Fórum da Cultura de Paz realizado no Museu de Arte de São Paulo no dia 09 de junho. A importância desse tema por mim desconhecido, pude constatar pela variedade de profissionais presentes e pelo tipo de intervenções no debate: Diretoria de Recursos Humanos da Polícia Militar, juízes, advogados, educadores, psicólogos, psicanalistas, jornalistas, assistentes sociais, pesquisadores acadêmicos, etc.

Durante as intervenções pude constatar que há diferentes projetos e grupos de pesquisa em andamento, inclusive de formação de jovens mediadores que atuam em escolas e associações de moradores. Pesquisando na internet, encontrei projetos que envolvem o Ministério da Justiça, escolas estaduais e comunitárias, promotoria pública, conselhos tutelares, etc.

No site da CNBB, há um documento em powerpoint que serviu para orientar a Campanha da Fraternidade deste ano, cujo tema era Fraternidade e Segurança Pública, o qual traz interessantes subsídios para a discussão da Conferência da Segurança Pública.

No município que comemora o primeiro tratado de paz da América – a Paz de Iperoig - a instalação de cursos de formação para mediadores de conflitos é uma idéia para ser pensada.

Será que aqui, diferente do resto do Brasil, todos têm acesso a uma justiça ágil, imparcial e competente?
Rui Grilo

ragrilo@terra.com.br

Twitter

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu