Opinião

Bem-vindos à intolerância

Mauro Chaves
Não são o preconceito, o ódio à diversidade, a não aceitação da diferença ou a intolerância as desgraças maiores que têm assolado o Brasil, tal como ocorre em tantos outros países e regiões do mundo. Nossas chagas são de outra ordem: a leniência, a frouxidão das leis, a complacência da Justiça, o excesso de tolerância e a síntese trágica de tudo isso, que é a impunidade. Os ilustres historiadores, sociólogos, juristas, filósofos, educadores - franceses, italianos, portugueses, congoleses, sul-africanos, cubanos, argentinos - que, neste preciso momento, estão participando do "Colóquio Internacional Tolerância e Direitos Humanos: Diversidade e Paz" (no Teatro Paulo Autran, do Sesc Pinheiros) bem que poderiam contribuir para que a sociedade brasileira saia da profunda frustração, da descrença em suas próprias instituições, do sentimento de indignada intolerância, de que se acha imbuída, em razão do crônico desrespeito ao direito à vida dos cidadão comuns, coisa jamais tratada com o mesmo carinho cívico-ideológico com que se tratam os direitos humanos dos bandidos.


Para sentir de perto esse "fenômeno" que atinge a sociedade brasileira bastaria aos participantes do simpósio se inteirarem do ocorrido apenas quatro dias antes da abertura do "Colóquio": as buscas ao paradeiro do garoto de 10 anos Kaito Guilherme Nascimento Pinto, em Cuiabá (MT), chegaram ao fim, porque o menino foi encontrado morto e violentado num terreno a apenas 500 metros do Fórum da capital do Estado de Mato Grosso. O estuprador, pedófilo e assassino Edson Alves Delfino (de 29 anos), que levou a polícia ao local do matagal em que deixara o corpo, já cumpria pena em regime semiaberto pelo mesmo tipo de crime - estuprara e matara a pauladas um menino de 8 anos. Condenado a 46 anos, cumprira nove e já fora beneficiado com a chamada "progressão da pena", passando para o regime de albergado, em que o preso só dorme na cadeia (quer dizer, faz o que quiser em liberdade, o dia inteiro, mas à noite sua dormida e a alimentação são custeadas pelo contribuinte). O assassino enganou Kaito - para cujo pai já trabalhara - oferecendo-lhe uma carona de moto, quando o menino esperava o ônibus para ir à escola. No caminho inventou que precisava pegar outro capacete, que escondera no matagal.

Os ilustres defensores da tolerância, nesse "Colóquio", poderiam também inteirar-se da quantidade enorme de indultados, em nosso País - em períodos natalinos e outros -, que aproveitam a liberdade provisória para empreender fugas definitivas, na maior parte das vezes reincidindo na brutalidade criminosa pela qual já haviam sido condenados; deveriam inteirar-se, ainda, de que no Brasil basta os criminosos cumprirem um sexto de suas penas (não se entendendo por que não um sétimo ou um nono) para conseguirem, por "bom comportamento" na prisão, a famigerada "progressão" (que só faz progredir o talento criminoso dos facínoras); deveriam atualizar-se com outro pormenor (ou pro-menor) do nosso ordenamento jurídico, que nos equipara, no mundo, a somente três outros países - Venezuela, Colômbia e República da Guiné - quanto à maioridade penal aos 18 anos.
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