Violência contra mulheres

Sakineh

Luiza Nagib Eluf
A opressão das mulheres é um problema mundial. O bloco ocidental do globo, porém, avançou nas diretrizes traçadas pelos direitos humanos e está aprendendo, devagar e firmemente, a respeitar a população feminina e reconhecer-lhe direitos iguais aos dos homens. No Brasil, temos leis que protegem a mulher da violência doméstica e, para isso, contamos com os serviços das delegacias de defesa da mulher e das Varas Especiais de Violência Doméstica, instituídas pela Lei Maria da Penha. Embora ainda exista muita agressão à mulher em nosso país, nada se compara à violência estatal que está em curso no Irã.

Sakineh Ashtiani, mulher iraniana de 42 anos, assim como muitas outras antes dela, encontra-se no corredor da morte. Seu crime, confessado mediante tortura, foi ter mantido relações sexuais fora do casamento. Ela estava separada do marido, quando encontrou outro homem que se tornou seu namorado. Por essa conduta, considerada adultério pela sharia, foi presa, torturada e condenada à morte. Posteriormente, acrescentaram-lhe mais uma acusação, que ela nega: ter assassinado seu ex-marido, em co-autoria. Há poucos dias, mais uma punição: 99 chibatadas por ter sido exibida na televisão uma fotografia sua, sem os trajes tradicionais da mulher muçulmana. Mesmo tendo ficado esclarecido, logo em seguida, que a foto não era dela, Sakineh continuou condenada ao açoite. Todos esses “crimes” foram-lhe atribuídos sem um julgamento justo, sem o devido processo legal. O advogado de Sakineh está foragido, por ter sido ameaçado de morte. Acabou renunciando ao mandato e não a defende mais. O filho dela, Sajad Qaderzadeh, foi interrogado pela polícia e ameaçado após ter dado entrevista a jornais estrangeiros, conforme informou a Anistia Internacional. Ainda segundo a mesma organização de defesa dos direitos humanos, no ano passado, foram executadas 388 pessoas no Irã, sendo 14 em ato público e pelo menos uma apedrejada. Um dos maiores índices de execução do mundo.

Sakineh corre o risco de ser executada brevemente, em ato de flagrante barbárie. A comunidade internacional vem intercedendo a seu favor. O Brasil ofereceu a ela asilo político, as organizações de direitos humanos pedem que ela seja poupada, mas as autoridades iranianas não parecem se sensibilizar com tais apelos.

Antes desses fatos, o presidente Lula foi mostrado em fotografias ao lado do presidente Ahmadinejad, ambos sorrindo e revelando ao mundo as relações de amizade entre os dois países. Apesar disso, não parece que a aproximação com o Irã esteja trazendo ganhos econômicos significativos ao nosso país. O momento exige, de nossa parte, posição firme em defesa dos direitos humanos e postura mais crítica com relação a países que executam cruelmente mulheres e homossexuais, pelo simples fato de serem mulheres e homossexuais. Nossa constituição federal proíbe toda e qualquer forma de discriminação, consagrando ampla proteção aos direitos da cidadania. Não podemos contrariar nossas próprias leis e ignorar violações gravíssimas, mesmo que cometidas por outros países.

Luiza Nagib Eluf é Procuradora do Ministério Público do estado de São Paulo. Foi Secretária Nacional dos Direitos da Cidadania no governo FHC. É autora de vários livros, dentre os quais “A paixão no banco dos réus” e “Matar ou morrer – o caso Euclides da Cunha”, ambos da editora Saraiva.

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