Artigo

As promessas do Pré-Sal

Demóstenes Torres no Blog do Noblat (original aqui)
Quando era estudante universitário, conheci um dentista e militante do Partidão, um daqueles prestistas da esquerda nacionalista que citava os doze Césares de memória e acreditava, apesar da oposição ao regime militar, na propaganda dos generais de que iríamos superar a crise do petróleo com a extração do óleo de nossas enormes reservas de xisto betuminoso. Era uma explanação fantástica de como retirar petróleo de pedra.

Eis que novamente nos encontramos diante de enorme promessa de futuro com o Pré-sal. Desta vez, o óleo e o gás natural vão nos dar suporte para financiar a educação, diminuir as disparidades de renda, criar capacidade tecnológica, enfim fazer definitivamente o Brasil grande.
Sequer houve definição do marco regulatório do Pré-sal e já há Estados em franca campanha para que os recursos que jorrarão dos royalties do petróleo permaneçam como estão, maldistribuídos e com a qualidade do gasto público pior ainda. É como disse o governador do Paraná, Roberto Requião: tem Unidade da Federação se preparando para ser espécie de Emirado Árabe.


Se for verdade que temos todo esse petróleo, os atuais valores gerados em royalties, R$ 10,9 bilhões em 2008, deverão por baixo ser multiplicados por cinco. Para ficar na escala local, hoje 907 municípios em 17 Estados recebem a compensação financeira.

A se considerar a propaganda que o governo federal faz do que vai acontecer daqui a 20 anos é de se pensar que a aplicação atual desses recursos tem dado suporte a uma revolução administrativa nas cidades contempladas. A Revista Desafios do Desenvolvimento, publicada pelo Ipea, mostra exatamente o contrário.

De acordo com a publicação, essa fonte preciosa de dinheiro adicional vem sendo aplicada sem o menor critério de responsabilidade fiscal. O primeiro problema é da má distribuição espacial. Do bolo municipal, 80% ficam no Estado do Rio de Janeiro e 84,1% do total vão para poucas cidades consideradas dinâmicas ou de alta renda. As localidades de baixa renda ficam com 3,2% do montante, ou seja, a maioria dos pequenos e médios municípios beneficiados apresenta baixíssimo índice de desenvolvimento humano.

O que ressalta mesmo é a falta de qualidade do gasto. De acordo com pesquisa do economista Sérgio Gobetti, citado na publicação, parte dos royalties é empregado para engordar a máquina administrativa. Gobetti aponta que o dispêndio do Legislativo local por habitante nos 100 maiores municípios que recebem a compensação financeira é de R$ 49,09 contra R$ 30,90 dos sem royalties. Esse grupo privilegiado de Prefeituras se dá ao luxo de despender 33% a mais com a folha de pessoal.

Enquanto isso, quando são medidos os investimentos produtivos, os recursos aplicados em obras de infraestrutura são praticamente os mesmos entre os mais e menos aquinhoados pelo crédito do petróleo.

Outro estudo, mencionado na reportagem, do também economista Fernando Postalis, mostra que os municípios que recebem royalties crescem menos que os não beneficiados com a atividade petrolífera. Postalis calculou que “para cada 1% adicional de royalties observa-se uma redução de cerca de 0,06% na taxa de crescimento do município."

A promessa é de que o Pré-sal abrirá o caminho do Brasil para chegar ao nível de desenvolvimento da Noruega. Como estão sendo aplicados os recursos atuais do petróleo estamos mais para a Nigéria.

Demóstenes Torres é procurador de Justiça e senador (DEM-GO)


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