Opinião

Contra o abuso e o descontrole

Editorial do Estadão
Não será com entrevistas bombásticas, nem com manifestos de solidariedade e desagravo, que avançará o debate sobre as normas às quais se deve subordinar o comportamento de magistrados, procuradores e agentes policiais no País. Trata-se de assegurar que o combate à criminalidade, sob todas as suas formas, não se degrade em violações até rotineiras dos direitos individuais - que nem sequer servem para levar esse combate a bom termo. O problema decerto não é novo, mas adquiriu feições novas desde que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, antes ainda de irromper a Operação Satiagraha e muito mais enfaticamente depois, passou a defender a adoção de uma lei rigorosa contra o abuso de autoridade na investigação de ilícitos penais.
Quanto maior a gravidade desses delitos e a notoriedade dos acusados de cometê-los, maior também a tendência à "espetacularização" dos procedimentos, no dizer de Gilmar Mendes. Prisões não só estrepitosas para consumo da mídia, como de discutível utilidade para o bom andamento dos inquéritos; vazamentos de informações protegidas pelo sigilo; e cerceamento do direito de defesa dos suspeitos cuja culpa, aliás, é de antemão dada como líquida e certa são exemplos característicos dos atos abusivos que se tornou imperativo inibir. Há quem diga que essa preocupação apenas se manifesta quando os atingidos fazem parte da chamada elite branca nacional, incluindo influentes endinheirados como Daniel Dantas. Pouco importa. Na realidade, o estabelecimento de limites nítidos à atuação das autoridades judiciais e policiais é do interesse de todos.
Dizia há meio século o udenista mineiro Pedro Aleixo que o mais temível nas ditaduras não é o ditador, mas o guarda da esquina. Ele há de ter inspirado o seu conterrâneo e correligionário Milton Campos, o primeiro ministro da Justiça do regime dos generais, a implantar, em 1965, uma até então inédita legislação contra o abuso de poder. Já passou da hora de atualizá-la. Não se concebe que no Estado democrático um juiz autorize a prisão de um acusado sem que os seus advogados tenham acesso ao inquérito policial em que se fundamentou a detenção. "É uma violência", resumiu o jurista Célio Borja, ex-ministro do STF, em entrevista ao Globo, no domingo. Outro abuso potencial é o que Gilmar Mendes chama "ação combinada" entre os agentes da lei. "Cabe à polícia investigar, ao Ministério Público oferecer denúncia e ao juiz, criticamente, aceitar ou não denúncia, pedidos de prisão, busca e apreensão", distingue.
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