Crateras

Destino certo

O homem medieval temia muitas coisas. Provavelmente o maior dos medos, fora o fogo eterno, era ser colhido pela peste que chegava e matava sem distinção de classes. Liquidava reis, camponeses, homens piedosos e sinceros e hereges avarentos, na mesma proporção. Quando não havia peste as pessoas tinham medo da terra se abrir e tragar os pecadores, ameaça sempre presente devido à fraqueza da carne. Tais temores, além de milhares de outros, perduraram até meados do século XX, quando parte considerável da população era analfabeta e mantinha tradições orais. Pois não é que em pleno século XXI aconteceu. A terra se abriu e engoliu quem estava por perto. Fico imaginando a sensação de estranheza daqueles que se viram tragados pela cratera em São Paulo. Um simples experimento mental já é aterrorizante, ao vivo e em cores deve ter sido a experiência da vida. O que terá acontecido? Quando estudei Mecânica dos Solos, há quase quarenta anos, percebi que havia muito a caminhar, embora houvesse exemplos de obras monumentais sem problemas. Naquela época o Egito estava construindo o complexo de Assuã e um professor muito solícito passava horas me explicando os problemas encontrados na elaboração do projeto. Talvez o solo que margeia o rio Pinheiros apresente um comportamento ainda não de todo decifrado. Ou quem sabe tenha havido barbeiragem. Certamente não aconteceu por causa de pecados ou falta de orações. Felizmente eu não estava lá, assim como não estava quando apareceu uma cratera de proporções bem mais modestas na rua Salvador Correia. Apesar de todo o meu ceticismo, tenho medo que a terra se abra e me lance nas profundezas do inferno antes do tempo, pois na época devida para lá irei certamente. (Sidney Borges)

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