Opinião

O Atentado ao nobre deputado

Afinal, como seria a reprodução da cena do crime? Crime mal cometido, o netinho não morreu - mas foi esfaqueado. Vaso ruim não quebra; tal avô, tal neto. Levou três pontinhos tão diminutos quanto sua moral e conduta. A começar pela participação, como vice-líder do PFL na Câmara, no reajuste de 91% do salário dos congressistas. Não é pouca coisa, é um salário salgado para o nosso bolso e alguns órgãos de mídia dizem que este foi o motivo pelo qual Rita de Cássia - nome de santa - atacou o nobre deputado, mas não me pareceu uma figura que fosse capaz de um ato radical desses em nome do povo.
A simulação do ataque se faz na minha cabeça: sai o digníssimo senhor ACM Neto do seu sério escritório de luxo e a mulher, considerada pelo vovô "são" da vítima uma louca, pula em cima do rapazinho inocente com uma peixeira, mostrando que é cabra da peste. Em dois dias, depois de imediatamente encaminhada para o presídio, considerada louca, repito, e sua vítima recuperada e serelepe, fim de papo. Historinha esquecida, manchete passada e o mártir da prole do Toninho Malvadeza volta à sua ativa, exercendo seus compromissos políticos.
As perguntas acerca do aprofundamento neste assunto que parece breve simplesmente brotam. Na cadeia, ela estará apanhando ou sendo parabenizada pelo ato? Será hora de um manifesto coletivo, uma espécie de campanha contra o reajuste: "Facas em punho, ESFAQUEIE você também o seu deputado!"? Diante dos microfones e das câmeras de TV, a pobre mulher gesticulava tal como um político fluente jurando honestidade, uma atuação digna de Hitler. É claro, sem áudio, não lhe deram ouvidos. Será mesmo só o reajuste, a causa da indignação da negra senhora? Quanto tempo ficará essa mulher presa? Provavelmente mãe de família, desempregada e desesperada. O nobre deputado passeará pela sua cidade natal, a minha Salvador, usufruindo do seu justíssimo aumento que se auto-concedeu.
Há mesquinharias inadmissíveis, há atitudes impensadas, há pessoas intragáveis, há justiça feita com as próprias mãos? Um atentado contra a vida nunca deve ser defendido, e não é este meu propósito, mas a indignação chega a tal ponto, que preso deveria ser quem não a compreende.
E o "vovô", "painho", "malvadeza", "cabeça branca", "coroné", "o que corrompe, mas faz" se julga tão "são" que esquece dos incalculáveis esquemas de chantagem e corrupção - devidamente abafados - ao longo de toda a sua história em busca do poder. A dúvida é quase como o vago questionamento dos poetas sobre o que vai além da vida. Neste caso, o que vai além do poder? Tanto ódio, tanta lama, tanta grana que fica impossível até abrir a boca. E é nessas horas, engasgados das injustiças que engolimos todos os dias, nós é que somos verdadeiramente apunhalados pelas costas. E o sangramento quase não estanca, enquanto assistimos o nobre deputado recuperar-se - e muitos dos seus colegas se fazerem, eternamente, de vítimas.

Lídia Dourado
Estudante, 18 anos, Salvador - BA

lidiacarla_@hotmail.com

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