Opinião

Pedágio para o dólar

Editorial do Estadão
Governo e exportadores puderam festejar - no primeiro dia, pelo menos - o resultado da nova ação do Ministério da Fazenda para conter o ingresso de dólares e a valorização do real. Desde o começo do ano a cotação da moeda americana havia caído 26,72% no mercado brasileiro, encarecendo as exportações nacionais e barateando as importações. Na segunda-feira, o ministro Guido Mantega anunciou a cobrança de um pedágio de 2% sobre a moeda estrangeira destinada aos mercados de ações e de renda fixa, incluídos os títulos públicos. Pelo menos o efeito imediato foi notável. No meio da tarde, ontem, o dólar chegou a ser cotado a R$ 1,762, com alta de 2,97%, uma variação quase incrível num país com reservas maiores que as de um ano antes, quando foi atingido pela maior crise internacional dos últimos 70 anos. Se outro objetivo era impedir a formação de uma bolha no mercado de ações, o resultado também foi um sucesso - apesar de um tanto exagerado. O Ibovespa caiu até 4,64%, logo depois do almoço. Recuperou-se um pouco, nas horas seguintes, mas no fechamento ainda acumulava uma queda de 2,88%.

Líderes da indústria aplaudiram a iniciativa do governo. Até segunda-feira, apenas o Banco Central (BC) vinha atuando no mercado de câmbio, principalmente para impedir oscilações excessivas. Suas intervenções permitiram a acumulação de um grande volume de reservas, mas não impediram a depreciação da moeda americana depois de vencido o primeiro impacto da crise internacional.

Ninguém sabe se o novo lance do Ministério da Fazenda será suficiente para conter a depreciação do dólar e conduzi-lo a um nível mais confortável para os produtores brasileiros. Em março do ano passado, o governo passou a cobrar 1,5% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas aplicações estrangeiras em papéis de renda fixa. A medida foi tomada principalmente para compensar, em parte, a extinção do imposto sobre o cheque, a CPMF. Serviu para elevar a arrecadação federal, mas não impediu a depreciação do dólar nos meses seguintes. A trajetória só foi interrompida com a turbulência financeira iniciada em setembro. O real desvalorizou-se, mas o efeito foi temporário e logo a moeda brasileira voltou a subir no mercado cambial.

O governo federal não tinha muitas opções para frear a queda do dólar. Se tentasse fixar uma cotação, jogaria no ralo a política de câmbio flexível adotada há dez anos. Poderia haver algum benefício imediato, mas o risco inflacionário seria elevado e, além disso, políticas de controle cambial tendem a perder eficácia com certa rapidez. O custo da troca seria provavelmente muito elevado - talvez desastroso. Comprar volumes muito maiores da moeda americana poderia ser mais um exercício - semelhante a muitos outros na experiência brasileira - de enxugar gelo. A contrapartida seria quase certamente um desarranjo na política monetária. Em suma: ao decidir elevar mais uma vez o IOF sobre o ingresso de moeda estrangeira o ministro da Fazenda escolheu o caminho menos perigoso. Sua eficiência poderá esgotar-se em pouco tempo, mas pelo menos a experiência não deverá deixar resíduos muito prejudiciais. Haverá consequências indesejáveis, naturalmente, e uma delas será, quase com certeza, o encarecimento da dívida pública.
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