Opinião

Freio na gastança

O Estado de S.Paulo - Editorial
O governo deverá cortar cerca de R$ 25 bilhões do gasto previsto no Orçamento para 2011 - talvez até mais, segundo algumas fontes. Essa decisão pode ser o primeiro passo de uma gestão mais austera das contas públicas, prometida pela presidente Dilma Rousseff e já mencionada em dezembro pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Um decreto deverá bloquear temporariamente a maior parte da despesa, para permitir uma revisão das projeções de receita e dos programas de cada setor. Bloqueios são obrigatórios quando o Orçamento demora a entrar em vigor, como tem ocorrido com frequência. Também é normal o contingenciamento nos primeiros meses, quando ainda há incerteza sobre a arrecadação. Desta vez, a precaução pode ser algo mais que mera rotina, para compensar excessos dos últimos anos e permitir o cumprimento da meta fiscal sem os truques contábeis de 2010.

Uma revisão preliminar seria necessária, de toda forma, porque os congressistas, como de hábito, aumentaram a receita orçamentária prevista para este ano. O acréscimo foi de R$ 25,3 bilhões. O aumento do gasto foi menor - R$ 20,2 bilhões -, e isso porque a senadora Serys Slhessarenko, relatora do projeto, adicionou R$ 5,1 bilhões à reserva de contingência. De acordo com a lei orçamentária, a liberação dessa reserva dependerá da arrecadação efetiva. Pôr essa verba de lado foi a fórmula escolhida pela relatora para atender ao desejo de gasto dos parlamentares e ao mesmo tempo dar alguma satisfação ao ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, empenhado sem sucesso em conter a farra orçamentária.

Essa farra é parte da rotina legislativa. A maioria dos parlamentares apoia a mudança da projeção da receita - sempre para cima - para acomodar milhares de emendas apresentadas para atender clientelas eleitorais, quando não para sustentar organizações de fins obscuros ou simplesmente fantasmas. Mas houve em 2010 um problema fora da rotina. A gastança do governo foi além das previsões pessimistas, a dívida bruta cresceu e os números foram maquiados com truques incomuns, como a conversão do aporte de capital à Petrobrás em receita do Tesouro.

Ao mesmo tempo, a inflação ganhou impulso, empurrada não só pelos preços dos alimentos - um problema internacional -, mas também pela demanda interna superaquecida. O superaquecimento do mercado resultou não só da expansão do emprego e da massa de rendimentos, mas também do excesso do gasto público.

Não se deve esperar da presidente Dilma Rousseff e de seus ministros uma crítica dos desmandos do governo anterior nem o reconhecimento do gasto público excessivo como parte do problema. Nenhuma autoridade falará de uma herança maldita. Mas, na área econômica, ninguém desconhece a gravidade do problema fiscal nem o risco de completa desmoralização da política, se o governo continuar recorrendo a artifícios para cumprir as metas.

De fato, o reconhecimento ocorreu ainda na gestão do presidente Lula, embora ele mesmo continuasse defendendo a gastança e o aumento de impostos para sustentar o Estado esbanjador. Mas ele aceitou manter a proposta de reajuste do salário mínimo para R$ 540 e não para R$ 570 ou valores ainda maiores defendidos por sindicalistas. Com essa decisão, e com o reajuste de 6,41% para as pensões e aposentadorias superiores a um salário mínimo, a Previdência será preservada de mais um grave desastre.

A nova ministra do Planejamento, Miriam Belchior, anunciou nessa segunda-feira a intenção de executar em ritmo acelerado as obras do PAC, mas controlando a despesa. Ela negou conhecer o tamanho do ajuste necessário, mas reiterou ser preciso um controle do gasto. Repetindo a expressão usada pela presidente Dilma Rousseff no discurso de posse, mencionou a estabilidade econômica como um "valor absoluto". A ministra exibiu também, como a presidente, a preocupação de tornar a gestão pública mais eficiente, para obter mais de cada real aplicado. Falta saber se a mudança irá além das palavras. Mas o novo discurso é animador.

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