Brasil

A defesa cênica de Renan Calheiros

Editorial de O Estado de S.Paulo, hoje:
"A cada crise que os envolve, os políticos brasileiros fazem pensar que o País seria outro, se aplicassem na defesa do interesse nacional uma fração que fosse do seu talento na defesa dos seus interesses pessoais. O exemplo da hora, naturalmente, é o da performance - no sentido mesmo em que se usa o termo nas artes cênicas - do presidente do Senado, Renan Calheiros, tendo como coadjuvantes muitos dos seus pares na chamada Câmara Alta da República. A fala do político alagoano, que reconheceu ter recorrido ao lobista de uma grande empreiteira para pagar aluguel e pensão à ex-namorada com quem teve uma filha, foi um espetáculo de prestidigitação de dar inveja aos mais experientes ilusionistas profissionais. A isso se seguiu um ensaiado truque de teatro, para preparar o grand finale da matinê de segunda-feira no plenário do Senado.
Os dicionários definem prestidigitação como a habilidade de fazer um objeto desaparecer das vistas do público ou de transformá-lo aparentemente em outro, num abrir e fechar de olhos. Foi o que fez o senador Calheiros, em 25 minutos. Ele tratou de transmutar numa “questão pessoal” - os desdobramentos de uma ligação extraconjugal - o problema objetivo das ligações, envolvendo dinheiro vivo, de um presidente do Congresso Nacional com o lobista Cláudio Gontijo, incumbido de promover os interesses de uma das maiores prestadoras de serviços ao setor estatal, a Mendes Júnior, junto aos donos do poder federal. O senador anunciou o passe de mágica logo na abertura de seu discurso, quando, diante de seus familiares acomodados na primeira fila do plenário, avisou que iria “rasgar a alma”.
Era Renan Calheiros no papel do penitente Bill Clinton, rasgando a alma em público, ao lado da mulher e da filha, por suas reinações com uma estagiária da Casa Branca, Monica Lewinsky. Com a diferença de que o americano falava daquilo que dizia respeito exclusivamente à sua “mais íntima privacidade”, para repetir uma expressão de Calheiros. Ao passo que este, com seu passe de mágica, tentava escamotear uma situação muitas vezes mais grave, do ângulo do decoro parlamentar, vale dizer, da moralidade pública: a origem suspeita dos valores entregues regularmente à jornalista Mônica Veloso por um lobista de uma grande empreiteira de obras públicas."

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