Opinião

Política industrial ou lobby

O Estado de S.Paulo - Editorial
O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, escolheu o caminho errado - e um tanto estranho - para avançar no debate sobre o poder de competição da indústria brasileira. O governo, disse ele, deveria aumentar o imposto de importação de veículos estrangeiros e reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) pago pelos fabricantes em operação no País. O assunto, reconheceu, pertence à área do Ministério da Fazenda, mas, apesar desse detalhe, recomendou uma consideração cuidadosa de suas propostas. Um lobista profissional não teria sido mais enfático. Ele mencionou também a hipótese de maior taxação de importações de outros segmentos. Ser capaz de enfrentar o produtor estrangeiro é sem dúvida uma condição não só para a criação de postos de trabalho, mas também, em primeiro lugar, para defesa dos empregos já existentes. Mas não se resolvem problemas de competitividade apenas com tributação. Além disso, não é adequado, para dizer o mínimo, o ministro Lupi invadir publicamente, com reivindicações de setores empresariais, uma área administrada por colegas seus.

Mais destoante, ainda, é a defesa de benefícios especiais para a indústria automobilística. A produção e as vendas do setor têm crescido neste ano menos velozmente que em 2010, mas, ainda assim, o desempenho das empresas tem sido claramente positivo. De janeiro a agosto foram produzidos 2,34 milhões de autoveículos, 4,4% mais que um ano antes. Os licenciamentos de veículos novos nacionais foram 2,2% mais numerosos que os de igual período de 2010. Foram licenciados 34,7% mais unidades importadas que entre janeiro e agosto do ano passado, mas esse número correspondeu a 22,4% do total de licenciamentos.

A exportação das montadoras aumentou em quantidade e a receita em dólares foi 23,1% superior à de um ano antes, segundo a associação das indústrias. Além disso, o número de empregados aumentou 8,8% de agosto do ano passado até agosto de 2011. Enfim, até agora os acordos salariais proporcionaram ganho real aos trabalhadores e novos planos de investimento foram anunciados nos últimos dias.

Sem dúvida, a concorrência internacional tem ficado mais dura, tanto pela retração de mercados quanto pelo aumento dos custos e pela valorização do real. Comerciantes se queixam de restrições ao crédito, em consequência de limitações impostas pelo Banco Central. Mas os mesmos problemas são enfrentados por empresas de outros setores. Além do mais, alguns segmentos da indústria têm sido severamente prejudicados pela concorrência de produtores chineses. Esses fabricantes são favorecidos pelo câmbio manipulado, a formação de seus preços nem sempre é clara e, além disso, mercadorias chinesas sujeitas a barreiras têm chegado por meio de triangulações comerciais.

Os Ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento têm procurado enfrentar alguns desses problemas. Isso é positivo. O governo pouco tem feito, no entanto, para melhorar de forma significativa e duradoura o poder de competição da maior parte dos produtores brasileiros. Algumas medidas previstas no Plano Brasil Maior, lançado em 2 de agosto, revelaram-se inadequadas. Outras, corrigem apenas parcialmente distorções fiscais, como a retenção absolutamente injustificável de créditos tributários. Impostos e contribuições inadequados a uma economia exposta à concorrência internacional continuam pesando sobre o investimento e sobre a produção. Outros fatores, como os problemas de logística e a escassez de financiamentos de longo prazo, poderiam alongar consideravelmente a lista das desvantagens.

O descompasso entre as vendas do comércio varejista e a produção industrial é conhecido. De janeiro a julho o comércio vendeu 9% mais do que um ano antes. A produção nacional avançou muito menos. Em 18 de 20 setores pesquisados pelo IBGE, o crescimento das importações superou o aumento da produção nacional. Há um problema sério, portanto, e o governo deveria enfrentá-lo tendo em vista as condições de competição de toda a produção brasileira. Fazer lobby a favor deste ou daquele segmento é função de agentes privados, não de ministros ou de quaisquer outros funcionários.

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