Opinião

Sobre regulações e controles

O Estado de S.Paulo - Editorial
Durante dois dias, especialistas internacionais em regulação e outros convidados da Secretaria de Comunicação da Presidência da República estiveram reunidos em Brasília para "debater os impactos das mudanças tecnológicas, seus desafios e oportunidades na nova era da digitalização", de modo a "fornecer subsídios para legisladores, reguladores, formuladores de políticas públicas e segmentos empresariais e da sociedade civil que lidam com as diversas questões relacionadas às comunicações". A realização do encontro foi proposta pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência em outubro, quando o governo desistiu da ideia de encaminhar ao Congresso um projeto de lei sobre o marco regulatório das comunicações eletrônicas, optando por transferir essa responsabilidade para o sucessor de Lula. Segundo anunciou no encerramento do seminário o ministro Franklin Martins, os subsídios recolhidos durante os debates serão oferecidos, primeiro, à consulta pública, e em seguida, após a formatação de um pré-projeto, encaminhados à presidente eleita, a quem caberá decidir se, como e quando enviá-lo ao Congresso Nacional.

A realização desse Seminário despertou interesse e criou polêmica por duas razões principais: primeiro, porque um marco regulatório das comunicações eletrônicas é realmente necessário, dada a completa desatualização da regulamentação em vigor, datada de 1962; depois, porque os habituais defensores do "controle social" da mídia pegaram carona na iniciativa para tentar colocar mais uma vez em pauta a "necessidade" do controle dos conteúdos nos veículos de comunicação.

Logo depois de eleita, Dilma Rousseff disse claramente o que pensa sobre o assunto, em entrevista à TV Bandeirantes: "Temos de distinguir duas coisas: marco regulatório e controle do conteúdo da mídia. O controle social da mídia, se for de conteúdo, é um absurdo. É um acinte à liberdade de imprensa. Não compactuo com isso. Se chegar à minha mesa qualquer tentativa de coibir a imprensa no que se refere à divulgação de ideias, propostas, opiniões, tudo o que for conteúdo, é o que eu falei: o barulho da imprensa é infinitas vezes melhor do que o silêncio das ditaduras." Mais claro, impossível. Quanto ao marco regulatório, no caso das comunicações eletrônicas é necessário disciplinar, por exemplo, a participação do capital estrangeiro e a interação entre a mídia digital e a radiodifusão (rádio e televisão), entre outras questões.

Durante o seminário, o próprio ministro Franklin Martins botou fogo na discussão ao mencionar a possibilidade de "enfrentamento": "A discussão está na mesa. Terá de ser feita. Pode ser num clima de enfrentamento ou de entendimento", disse, em tom de sequestrador de embaixador. E desdenhou dos que manifestavam preocupação com a possibilidade de o tal "controle social" desbordar para a pura e simples censura da mídia: "Essa história de que a liberdade de imprensa está ameaçada é bobagem, fantasma, um truque. Isto não está em jogo."

Não obstante, não é de geração espontânea a desconfiança em relação às verdadeiras intenções dos defensores do "controle social" da imprensa. Essa desconfiança, reiterada durante o seminário por dirigentes de entidades representativas dos veículos de comunicação, tem a ver, por exemplo, com as discussões que se travaram um ano atrás, também sob o patrocínio da Presidência da República, na Conferência Nacional de Comunicação. Essas discussões já começaram a produzir efeito em vários Estados, em cujas Assembleias Legislativas tramitam projetos que objetivam de alguma forma criar controles sobre os veículos de comunicação. Isso para não falar na ofensiva contra a liberdade de imprensa na Venezuela, na Bolívia e na Argentina.

Após o encerramento do seminário, certamente se dando conta da conveniência de recalibrar o tom do discurso carbonário da véspera, o ministro Franklin Martins tratou de colocar a questão em termos civilizados: "A regulamentação nas comunicações eletrônicas, especialmente quando se trata de concessões públicas, é uma tarefa que cabe ao Estado fazer, à sociedade discutir, ao Congresso legislar e às agências, depois, fazer a regulação e fiscalizar." Agora é com a futura presidente.

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