Opinião

O racismo contra Obama

Editorial do Estadão
O presidente Barack Obama recusou-se na quarta-feira a responder à pergunta de um repórter sobre o que pensava da afirmação do ex-presidente Jimmy Carter de que "grande parte da animosidade em relação ao presidente Obama se deve ao fato de ele ser negro". Carter, que nasceu no Estado sulista da Geórgia e ocupou a Casa Branca de 1977 a 1981, falava da onda de furiosos ataques de que Obama tem sido alvo, na mídia conservadora radical, em assembleias comunitárias e numa passeata que reuniu sábado último perto de 80 mil pessoas em Washington.

A razão, ou o pretexto, é o seu principal projeto de governo, a reforma do sistema americano de saúde. O ódio chegou a tal ponto que, ao defender a sua proposta no Congresso, na semana passada - em um discurso desde logo considerado por observadores independentes como "um dos momentos definidores de sua presidência" -, Obama teve de fingir que não ouviu o grito do deputado republicano Joe Wilson, da Carolina do Sul: "Você mente!" O deputado se desculpou em seguida, a grosseria foi repudiada em plenário pelo voto da ampla maioria democrata na Câmara dos Representantes, mas o incêndio se alastrou.

De um lado - e sintomaticamente -, Wilson se tornou da noite para o dia o mais novo herói da direita americana. De outro, o inédito episódio levou o ex-presidente Carter a dizer que "o racismo voltou a emergir porque muitos brancos acham que um afro-americano não está qualificado para liderar a nação". Antes dele, a ferina colunista Maureen Dowd, do New York Times, escreveu, em artigo publicado no Estado de quinta-feira, que Wilson quis dizer "você mente, rapaz". Rapaz, no caso, era como os racistas brancos se dirigiam, entre o desprezo e a condescendência, aos negros de qualquer idade.

O silêncio de Obama é compreensível. Primeiro, é coerente com a posição que adotou desde o início da campanha de se considerar um candidato "pós-racial" - de fato, nem antes nem depois de enveredar pela política ele se vinculou ao movimento negro, muito menos fez da cor um passaporte. Decerto por uma mistura de cálculo eleitoral e convicção íntima, procurou ser visto como um presidente que por acaso é negro em vez de eventual primeiro presidente negro de seu país. Em segundo lugar, tudo o que ele não precisa, a esta altura, é contaminar o seu combalido plano de reforma da saúde, que sofre uma barragem de críticas, com um debate sobre o fator racial. Isso seria no mínimo contraproducente para a superação das resistências à proposta no próprio Partido Democrata. Objetivamente, além disso, tem parcela de razão o ex-secretário de Estado Colin Powell, também negro, quando diz que a hostilidade a Obama se deve muito à beligerante cultura política americana, amplificada pelas vozes extremistas na internet, TV a cabo e talk-shows no rádio.
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