Opinião

O cartório do pré-sal

Editorial do Estadão
Muito antes do petróleo explorado comercialmente, privilégios para alguns grupos empresariais poderão jorrar das grandes e promissoras áreas do pré-sal. Estimulados pelas promessas de uma nova fase de nacionalismo cartorial, fabricantes de máquinas e equipamentos já mobilizam grupos de apoio, no Congresso, para garantir sua presença como fornecedores de material para a exploração dos novos campos. O deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) já se propôs a defender duas emendas ao Projeto de Lei 5.938, relativo à produção de petróleo e gás em regime de partilha. Pela primeira, será instituído um bônus especial para o comprador de máquinas e equipamentos. Pela segunda, a produção e a comercialização desses materiais serão desoneradas de tributos e, além disso, as empresas terão acesso a condições especiais de financiamento pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e haverá incentivos à inovação.

Ao propor essas emendas, o lobby da indústria de bens de capital aproveita uma oportunidade criada pelo governo. Segundo o projeto de lei, o edital de licitação deverá indicar, entre outros itens, "o conteúdo local mínimo e outros critérios relacionados ao desenvolvimento da indústria nacional". Noutro capítulo, há referência à definição de uma "política de desenvolvimento econômico e tecnológico da indústria de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, bem como de sua cadeia de suprimento". Ao detalhar esses itens, as duas propostas favorecem a criação de estímulos especiais e de subsídios a alguns segmentos da indústria de bens de capital - e apontam para a instituição de mais um cartório.

Ao defender a conversão do pré-sal em fonte de favores especiais, os dirigentes do setor de bens de capital vão contra os interesses mais amplos da indústria nacional e até dos fabricantes de máquinas e equipamentos. A desoneração fiscal do investimento é um velho objetivo de quem se preocupa com a competitividade da indústria brasileira. A tributação do investimento é uma das maiores desvantagens do setor produtivo brasileiro e um dos principais obstáculos à conquista de posições no mercado global. Um lobby industrial sério deveria cuidar da eliminação total dessa distorção, em vez de batalhar pela criação de um cartório para alguns grupos empresariais. É preciso desonerar tanto o fabricante de meias quanto o produtor de automóveis e o enlatador de salsichas, para facilitar a modernização de suas fábricas.
Leia mais

Twitter

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mosca-dragão

Pegoava?

Jundu