Opinião
As confusões do Enem
O Estado de S.Paulo
Em resposta à decisão da primeira instância da Justiça Federal do Ceará, que permitiu aos estudantes acesso às cópias das provas de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o ministro da Educação, Fernando Haddad, fez dois comentários infelizes. Depois de classificar a decisão como um "atentado" contra o sistema de seleção unificado das universidades federais, ele disse que as liminares concedidas pelo Judiciário estão levando a máquina administrativa do MEC "à fadiga", inviabilizando a realização de duas provas por ano, como pretendia o governo.
"Não podemos recuar diante dessa covardia que é cometida contra o Exame. Temos de ter coragem de perseverar na direção de consolidar o sistema", disse Haddad, durante o programa Bom Dia, ministro, onde fez um balanço de sua gestão, despedindo-se do cargo. Segundo ele, ao gerar "problemas novos", os recursos interpostos pela Procuradoria da República em favor de estudantes e as decisões favoráveis a eles dadas pelo Poder Judiciário vêm dificultando a implementação das mudanças que prometeu fazer no Enem. Haddad também classificou, textualmente, como "covardia" os problemas causados pelo vazamento de questões por dois funcionários do Colégio Christus, de Fortaleza.
Na realidade, o que o ministro pretendia com essas declarações era eximir-se de responsabilidade pelos problemas que desfiguraram o Enem e comprometeram o sistema de avaliação escolar. Por inépcia do MEC, as edições do Enem de 2010 e 2011 foram marcadas por vários problemas - da falta de um sistema de informática eficiente a denúncias de irregularidades na licitação das gráficas encarregadas de imprimir os cadernos de questões, além de enviesamento ideológico na formulação de perguntas.
A falta de critérios objetivos para a correção dessas provas foi evidenciada em pelo menos dois casos. No primeiro, por um estudante do Colégio Lourenço Castanho, de São Paulo, considerado o melhor aluno de sua turma, que tirou zero na redação do último Enem. Em resposta a um pedido de esclarecimento formulado pela escola, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) alegou que a prova havia sido anulada por "conter impropérios". E, quando o estudante e seus professores solicitaram cópia da prova, o MEC se negou a fornecê-la, mas aumentou a nota de zero para 880 pontos. No segundo caso, uma professora de um cursinho de Campinas, que se inscreveu no Enem de 2011 só para obter o caderno de questões, entregou em branco os cartões de resposta e, mesmo assim, obteve em todas as provas - com exceção da de matemática - notas maiores do que as notas mínimas divulgadas pelo Inep. "Nos dois dias, assinei meu nome, respondi à frase de verificação de presença e dormi", relatou. Ela pediu esclarecimento sobre os critérios de correção e a resposta do MEC veio com erros de português.
Com o precedente aberto pela mudança na nota de redação do aluno do Colégio Lourenço Castanho, outros alunos também pediram ao Inep a reavaliação de suas provas. No início, o órgão se recusou a atender aos pedidos. Em seguida, alterou a nota de redação de 129 candidatos. Na semana passada, o Inep informou que colocará cópias das redações na internet, a partir do Enem de 2012. Além disso, o MEC assinou com o Ministério Público Federal um Termo de Ajustamento de Conduta, comprometendo-se a automatizar os pedidos de vista das provas. Na ocasião, as autoridades educacionais alegaram não ter condição técnica de adotar a medida com relação ao Enem de 2o11. Mesmo assim, na terça-feira, o juiz Luís Praxedes Vieira, da 1.ª Vara Federal de Fortaleza, determinou que o MEC mostre a prova de redação a todos os candidatos que a requererem, o que levou Haddad a afirmar que o Enem estaria sofrendo um "atentado".
Exagero à parte, o que se pode concluir é que a reforma do Enem foi conduzida de modo açodado, a gestão administrativa do MEC é ineficiente e, como reconhecem os especialistas, a correção das provas de redação peca pelo excesso de subjetividade dos corretores e pela falta de critérios uniformes.
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O Estado de S.Paulo
Em resposta à decisão da primeira instância da Justiça Federal do Ceará, que permitiu aos estudantes acesso às cópias das provas de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o ministro da Educação, Fernando Haddad, fez dois comentários infelizes. Depois de classificar a decisão como um "atentado" contra o sistema de seleção unificado das universidades federais, ele disse que as liminares concedidas pelo Judiciário estão levando a máquina administrativa do MEC "à fadiga", inviabilizando a realização de duas provas por ano, como pretendia o governo.
"Não podemos recuar diante dessa covardia que é cometida contra o Exame. Temos de ter coragem de perseverar na direção de consolidar o sistema", disse Haddad, durante o programa Bom Dia, ministro, onde fez um balanço de sua gestão, despedindo-se do cargo. Segundo ele, ao gerar "problemas novos", os recursos interpostos pela Procuradoria da República em favor de estudantes e as decisões favoráveis a eles dadas pelo Poder Judiciário vêm dificultando a implementação das mudanças que prometeu fazer no Enem. Haddad também classificou, textualmente, como "covardia" os problemas causados pelo vazamento de questões por dois funcionários do Colégio Christus, de Fortaleza.
Na realidade, o que o ministro pretendia com essas declarações era eximir-se de responsabilidade pelos problemas que desfiguraram o Enem e comprometeram o sistema de avaliação escolar. Por inépcia do MEC, as edições do Enem de 2010 e 2011 foram marcadas por vários problemas - da falta de um sistema de informática eficiente a denúncias de irregularidades na licitação das gráficas encarregadas de imprimir os cadernos de questões, além de enviesamento ideológico na formulação de perguntas.
A falta de critérios objetivos para a correção dessas provas foi evidenciada em pelo menos dois casos. No primeiro, por um estudante do Colégio Lourenço Castanho, de São Paulo, considerado o melhor aluno de sua turma, que tirou zero na redação do último Enem. Em resposta a um pedido de esclarecimento formulado pela escola, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) alegou que a prova havia sido anulada por "conter impropérios". E, quando o estudante e seus professores solicitaram cópia da prova, o MEC se negou a fornecê-la, mas aumentou a nota de zero para 880 pontos. No segundo caso, uma professora de um cursinho de Campinas, que se inscreveu no Enem de 2011 só para obter o caderno de questões, entregou em branco os cartões de resposta e, mesmo assim, obteve em todas as provas - com exceção da de matemática - notas maiores do que as notas mínimas divulgadas pelo Inep. "Nos dois dias, assinei meu nome, respondi à frase de verificação de presença e dormi", relatou. Ela pediu esclarecimento sobre os critérios de correção e a resposta do MEC veio com erros de português.
Com o precedente aberto pela mudança na nota de redação do aluno do Colégio Lourenço Castanho, outros alunos também pediram ao Inep a reavaliação de suas provas. No início, o órgão se recusou a atender aos pedidos. Em seguida, alterou a nota de redação de 129 candidatos. Na semana passada, o Inep informou que colocará cópias das redações na internet, a partir do Enem de 2012. Além disso, o MEC assinou com o Ministério Público Federal um Termo de Ajustamento de Conduta, comprometendo-se a automatizar os pedidos de vista das provas. Na ocasião, as autoridades educacionais alegaram não ter condição técnica de adotar a medida com relação ao Enem de 2o11. Mesmo assim, na terça-feira, o juiz Luís Praxedes Vieira, da 1.ª Vara Federal de Fortaleza, determinou que o MEC mostre a prova de redação a todos os candidatos que a requererem, o que levou Haddad a afirmar que o Enem estaria sofrendo um "atentado".
Exagero à parte, o que se pode concluir é que a reforma do Enem foi conduzida de modo açodado, a gestão administrativa do MEC é ineficiente e, como reconhecem os especialistas, a correção das provas de redação peca pelo excesso de subjetividade dos corretores e pela falta de critérios uniformes.
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