Coluna da Dra. Luiza Eluf

Por uma Justiça atenta

Luiza Nagib Eluf
Nosso sistema jurisdicional estabelece a passividade dos juízes. Isso significa que os magistrados somente se manifestam quando provocados por petição da parte interessada. Tal não impede, porém, que uma vez provocada a dizer quem tem razão na solução de um conflito de interesses, a Justiça se esmere em apurar os fatos e acompanhe com atenção as determinações que ela mesma vier a fazer. A prestação jurisdicional é um direito da cidadania. Desta forma, expedir um mandado de prisão e não acompanhar de maneira atenta e sistemática o cumprimento desse mesmo mandado, ainda que isso dependa da ação da polícia, torna a Justiça inócua.

Outro exemplo: recentemente, soubemos pela imprensa que uma menina de cinco anos, disputada pelos pais separados, foi entregue ao genitor pelo prazo de 90 dias, a fim de evitar-se a alienação parental. A mãe, que ficou proibida de ver a criança pelo período mencionado, protestou e avisou que o sujeito era perigoso, mas a Justiça determinou a proibição de visitas da mãe. Após algum tempo de convivência com o pai, a criança chegou ao pronto-socorro com lesões corporais e em coma. Houve notícia de jornal segundo a qual a criança também apresentava fissura anal. Não há informações sobre a responsabilidade do pai pelo ocorrido, não se pode prejulgar ninguém, mas já se sabe que algo de muito grave aconteceu. No mínimo, houve negligência. É certo que o pai precisa participar da criação dos filhos, mas quando houver dúvidas, devem-se decretar medidas preventivas de acompanhamento diário da situação da criança no novo lar, por profissionais nomeados pelo Juízo.

Outro episódio que chocou a todos foi o desaparecimento e provável assassinato de Elisa Samudio. A moça havia procurado a Vara de Violência Doméstica para pedir ajuda, pois estava sendo ameaçada de morte pelo goleiro Bruno, suposto pai de seu filho. A Juíza que analisou o caso entendeu que não era competente para julgá-lo porque Elisa não teria um relacionamento estável com o jogador de futebol. Assim, não poderia contar com as medidas protetivas da Lei Maria da Penha e deveria procurar uma Vara Criminal Comum. Apreensiva, Elisa gravou um depoimento em vídeo dizendo que, se algum mal lhe acontecesse, o culpado seria Bruno.

É óbvio que, quando alguém está em perigo iminente, a Justiça precisa agir independentemente da competência em razão da matéria ou do lugar. Pessoas ameaçadas não podem esperar. Entendo que Elisa deveria, receber a proteção que pediu com base na Lei Maria da Penha, pois era vítima de violência de gênero.

É difícil dizer se o resultado da morosidade jurisdicional foi o seqüestro e o desaparecimento da moça, mas uma Justiça atenta e preocupada com o bem estar das pessoas que a procuram poderia, sim, ter ajudado. Mesmo entendendo não ser competência do Juizado de Violência Doméstica, deveria ter sido providenciada proteção à vítima. Uma Justiça atenta age primeiro e depois discute a questão burocrática.

Luiza Nagib Eluf é Procuradora de Justiça do Ministério Público de São Paulo.

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