Opinião

Dilma em nova enrascada

O ESTADO DE S.PAULO
A reincidência de Dilma Rousseff em erros políticos absurdos e grosseiros já não surpreende ninguém, mas é extremamente preocupante quando se tenta imaginar para onde esse comando errático está levando o País. A última trapalhada da presidente da República levou-a a atribuir in extremis ao vice-presidente Michel Temer a responsabilidade pela articulação política do governo. Como Dilma não entende do assunto, faz sentido que finalmente tenha delegado essa missão a quem é comprovadamente do ramo. Resta saber se o arranjo vai funcionar. Não há nenhuma razão para otimismo.

O apelo à ajuda de Temer foi a saída encontrada por Dilma depois que, tendo tido a imprudência de formalizar e deixar vazar convite ao ministro peemedebista da Aviação Civil, Eliseu Padilha, para assumir a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência, ouviu um não como resposta. A opção pouco ortodoxa que lhe restou dá a medida da enrascada em que se metera.

A esperança de Dilma é que, na condição de presidente do partido que é, formalmente, o maior aliado do governo e exerce papel hegemônico no Congresso, Michel Temer seja capaz de pelo menos neutralizar a enorme hostilidade com que os peemedebistas Renan Calheiros e Eduardo Cunha, que hoje dão as cartas no Senado e na Câmara, se esmeram em colocar pedras no caminho do Executivo, impondo ao Palácio do Planalto sucessivas derrotas na votação de matérias de seu interesse.

A julgar pelo entusiasmo com que Calheiros e Cunha conduzem seus projetos de consolidação da "independência" do Parlamento, é fácil de supor que nem mesmo Michel Temer terá vida fácil com eles. Para aquelas raposas políticas, tanto a autonomia do Poder Legislativo como a hegemonia de seu PMDB são importantes na exata medida em que servem a seus próprios projetos políticos.

Michel Temer sabe disso melhor do que ninguém, até porque administra com zelo a própria carreira, tem o dom de farejar o perigo de longe e, por isso, jamais mete a mão em cumbuca. Por mais que se tenha sempre empenhado em demonstrar fidelidade como aliado de Dilma e por maior que seja sua habilidade na costura política, não se pode esperar de Temer que chegue a ponto de hostilizar para valer os dois correligionários que são um pesadelo para a chefe do governo. Além disso, é uma incógnita o nível de resistência que Temer enfrentará por parte do PT, que sempre olhou os aliados de cima para baixo e dificilmente assimilará de boa vontade, agora, o alijamento de qualquer protagonismo na articulação política central.

Dilma passou os primeiros três meses do segundo mandato mantendo Temer à margem do núcleo duro político do governo. Por absoluta falta de opção recorre a ele agora. Porque tem a habilidade política que falta à presidente e nada da arrogância que nela sobra, certamente Temer não se prevalecerá da situação para dar o troco. Mas dificilmente conseguirá deixar a própria Dilma e o PT plenamente à vontade com o novo arranjo. Até porque, tendo tido a sabedoria de se recusar a ser ministro em substituição a Pepe Vargas e reivindicado a transferência de toda a estrutura da Secretaria de Relações Institucionais para o gabinete da Vice-Presidência, Temer se tornou virtualmente intocável como articulador político. Seria altíssimo, talvez inadmissível, o preço a pagar por Dilma por um eventual afastamento do vice-presidente da República das funções que acaba de a ele delegar. Seria talvez o pretexto que muitos peemedebistas aguardam para colocar o partido formalmente na oposição.

Assim, Dilma Rousseff se revela insuperável, mais uma vez, na tarefa de criar problemas para si própria. Poderá até se redimir da indelicadeza que cometeu com seu amigo Pepe Vargas, ao permitir que ele soubesse da própria demissão pela imprensa, realocando-o em outra pasta. Poderá até tirar de letra a frustração do chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, pela perda do protagonismo que vinha desempenhando na articulação política. Certamente mais difícil será ter de ouvir o que Lula tem a dizer, depois de ter sugerido e visto frustrada a nomeação de Eliseu Padilha. Enquanto isso, o País prende a respiração, à espera do próximo capítulo dessa novela sem fim.

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