Política

Os doidos sábios e os sábios doidos
 
O Zuccotti Park, a dois quarteirões de Wall Street, é pouco menor do que um campo de futebol. Há três semanas, quem passava por lá via a fauna das causas perdidas. Colchões no chão, batuque e até uma vuvuzela. Um cabeludo flanava no seu skate e uma jovem vestia camiseta e calcinha de flores (um biquíni de vovó, se comparado aos fios dentais).

Havia uma estranha ordem naquele caos. Os canteiros de flores, intocados, e jovens (uma de luvas) recolhiam o lixo.

Os doidos do "Ocupe Wall Street" espalharam-se por 82 países, de Roma a Taiwan. Em todos os lugares, a pergunta é uma só: qual é a agenda dessa gente?

Nesta semana, o ilustrador Barry Blitt (aquele que durante a campanha eleitoral de 2008 desenhou um Obama muçulmano e Michelle com uma metralhadora a tiracolo) matou a charada na capa da revista "The New Yorker". Cinco banqueiros de cartola empunham cartazes e um deles pede: "Deixe as coisas precisamente como estão."

E elas estão assim: com o país tecnicamente fora da recessão, a taxa de desemprego americana está em 9%, a maior desde os anos 40, excetuado um breve repique nos anos 80.

Os lucros das corporações estão no maior nível dos últimos 70 anos, mas os salários bateram no mais baixo patamar desde 1960. Todos os indicadores de renda do andar de cima vão bem, mas querem mandar a conta da ruína para o andar de baixo, cortando políticas sociais, tanto nos Estados Unidos como na Europa.

A patuleia do parque é o novo personagem da crise. Não tem agenda? Em 1967, numa marcha contra a guerra do Vietnã, o poeta Allen Guinsberg propôs que as energias dos manifestantes fossem concentradas para fazer levitar o prédio do Pentágono. O Pentágono não levitou, mas o presidente Lyndon Johnson desistiu de concorrer à reeleição. Em 1989 os tchecos manifestavam-se chacoalhando chaveiros.

Nem os doidos do parque acham que o companheiro Obama desistirá da reeleição, mas ele parece não ter entendido o ronco da rua. No domingo, inaugurando o monumento a Martin Luther King (outro doido), disse que não se deve satanizar "todos aqueles que trabalham" em Wall Street.

Blá-blá-blá, pois ninguém está protestando contra todos os operadores do papelório, mas contra o que a turma do papelório fez à economia mundial, emprestando dinheiro a quem não podia pagar, na certeza de que parolagem do "risco sistêmico" impediria que fossem à garra.

Nos anos 80, salvou-se a ciranda dos sábios da banca quebrando-se a América Latina, inclusive o Brasil. Agora, os Estados Unidos e a Europa estão provando o velho veneno e não gostam dos seus efeitos.

À época, a mágica foi praticada por Paul Volcker, o presidente do banco central americano. Em 2008, aos 81 anos, ele assessorava Obama. Não havia por que passar a conta adiante, e ele propunha que se baixasse o chanfalho na banca. A certa altura, tratava-se de deixar que o Citibank quebrasse. Obama vacilou, Volcker foi-se embora e o resultado está aí.

A sabedoria dos sábios tornou-se maluquice e entraram em cena os doidos, como sábios.

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