Política

Dilma versus PT

Ruy Fabiano (original aqui)
Governo e oposição estão em crise, mas por razões opostas: a oposição por fraqueza, falta de rumos e objetivos; o governo, paradoxalmente, por estar apoiado por um partido mais forte que ele, o PT, ao qual não faltam nem rumos, nem objetivos.

Em setembro do ano passado, falando a sindicalistas petroleiros na Bahia, José Dirceu, considerava que a eleição de Dilma Roussef era ainda mais importante que a de Lula.

“Ele (Lula) é duas vezes maior que o PT", dizia, enquanto Dilma representaria “a chegada do projeto partidário ao poder”.

Lula, liderança carismática, teria sido uma etapa de “acumulação de forças” do partido, permitindo que superasse resistências e chegasse ao governo federal.

Para tanto, gozou de uma certa licença ideológica, levando o partido a concessões que, com Dilma, teriam que ser suprimidas.

O discurso é longo e foi feito sem que o orador soubesse da presença de jornalistas no local, o que faz supor que falou sem inibição, a um público de adeptos.

Na ocasião, fez menção à liberdade de imprensa, que vê com restrições, e as repercussões se limitaram a esse quesito de sua fala.

O ponto central, no entanto, é a preponderância do PT sobre a presidente, o que pressupõe estado de tensão permanente entre ambos, que já se manifestou (e continua) no preenchimento de cargos no governo.

Dilma não é uma petista histórica. Veio do PDT de Brizola. Há afinidades de pontos de vista, mas não necessariamente comunhão plena de ideias e métodos.

Dilma, como Lula, lida com alianças ideologicamente contraditórias, uma espécie de arca de Noé sem Noé, cuja síntese é o PMDB. Tem que fazer concessões ou não governa. Caso exemplar dá-se na presente votação da reforma do Código Florestal.

O PT histórico – a esquerda de um modo geral - é contra o relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que contempla postulações dos produtores rurais.

Mas Dilma não pode afrontá-los por algumas razões incontornáveis. A primeira: precisa dos votos da chamada bancada ruralista, que permeia tanto a base governista como a oposição.

A segunda: é o setor rural que, já há alguns anos, oferece os melhores resultados na balança comercial, garantindo alguma performance na economia. Nada mais insano que afrontá-lo em tal circunstância, mesmo sabendo que o modelo de política agrícola sustentado pelo partido é bem distinto, para não dizer oposto.

O que disso resulta é a condição de refém político da presidente. De um lado, a pressão do PMDB por cargos; de outro, a do PT, por cargos, decisões e indecisões.

A estabilidade da presidente depende das relações com o partido, que cobra o seu preço, que não é barato, indispondo-a frequentemente com os demais aliados.

A eleição de Rui Falcão, petista ortodoxo, para a presidência do partido, derrotando Humberto Costa, o candidato de Lula e Dilma, reforçou a tutela partidária.

Rui reza pela cartilha de Dirceu, que, nesses termos, mesmo sem cargos no governo, tornou-se mais influente e poderoso que qualquer ministro.

Tem a chave da estabilidade partidária. Nada se decide nesse âmbito sem sua chancela. O paradoxo é que essa tensão mantém Lula em cena. Ele continua maior que o PT, embora, fora da Presidência, tenda a encolher gradualmente. É a ele que Dilma recorre quando a barra pesa – e tem pesado continuamente.

Se houvesse oposição, tudo isso estaria sendo exposto e faturado. A sorte do governo e do PT é que, enquanto este desfruta da “acumulação de forças”, mencionada por Dirceu, a oposição vive processo oposto. O seu saco de gatos está furado e os que ali resistem cuidam de sobreviver politicamente, sem tempo para detalhes como fazer oposição.

Os governos petistas, de Lula e Dilma, têm perfil socialdemocrata. O projeto petista é revolucionário. Não há ilusão entre os seus formuladores de que seja possível implantá-lo de uma vez, mas querem avançar, mesmo sabendo que cada passo à frente abre conflitos políticos com forças hoje aliadas.

Dilma não quer saber desses conflitos, sobretudo neste momento em que a economia começa a exibir fragilidades que não atingiram seu antecessor, beneficiário de uma conjuntura internacional próspera que já não existe.

A herança de Lula recomenda que o governo continue pragmático. O projeto petista ignora essa herança e prega novas escaramuças sobre o Estado, que já lhe pertence. O que disso resultará ninguém sabe. Mas todos temem.

Ruy Fabiano é jornalista

Nota do Editor - A análise sobre o PT está correta, mas quando o articulista fala no poder do partido escorrega em baba de quimera. No Brasil clientelista manda quem tem a caneta na mão. Dilma é coerente, articulada e sabe onde está pisando. O único temor que desperta é quanto à sua saúde. Vida longa à presidente, o melhor legado de Lula ao país. Sidney Borges

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