Na Mata Atlântica

Vivendo e sonhando

Sidney Borges
Romeu Féres, o sabiá, chegou cedo. Pousou ao lado da janela do quarto e soltou o dó de peito. Acordei. Cinco e quarenta e oito, olhei de novo, cinco e cinquenta e quatro. Devo ter cochilado. Lá fora o bardo continuava a produzir ondas sonoras de grande intensidade. Sem conseguir conciliar o sono resolvi pensar. 


Comecei imaginando o Universo sem o bóson de Higgs. Para quem não se lembra, ou não está familiarizado, bóson de Higgs é a partícula subatômica que dá massa a outras partículas. Massa é a propriedade que faz com que um objeto atraia outro objeto que também tenha massa. Sem massa, sem atração gravitacional, ou seja, sem o bóson de Higgs seríamos leves, ou melhor levíssimos, pois a Terra não nos atrairia.

Mas também não atrairia a Lua e esta iria embora. O Sol também não atrairia a Terra, na verdade sem massa o Sol nem sequer existiria. Não existindo gravidade não haveria luz solar. Sem o bóson de Higgs o Universo seria constituído de partículas isoladas e sem interação gravitacional. Individualismo quase total!

Foi por isso que Deus criou o bóson de Higgs e encheu o Universo com ele, como enchemos uma jarra com água.

Pensei tanto que adormeci. Sonhei que estava na idade do bronze, para ser mais preciso em Stonehenge, bem no momento em que estavam erguendo uma pedra de 50 toneladas. Sem máquinas, sem guindastes, apenas com as mãos! 

Sem que os trabalhadores notassem a minha presença acompanhei o transporte de outra pedra, desta vez mais leve, umas 30 toneladas. Primeiro a envolveram em um tecido que parecia aquele filme plástico que usamos para embrulhar alimentos antes de colocar na geladeira. Depois de concluído o trabalho ligaram uma mangueira ao envólucro e um som agudíssimo encheu os ares. 

Da mangueira saiu uma espécie de vapor de cor salmão. Um inspetor fechou o buraco onde a mangueira fora introduzida. A pedra estava pronta para ser transportada o que foi feito por uma graciosa menina de tranças de não mais de doze anos.

Entendi tudo. O vapor cor de salmão é que dava massa à pedra. Um caldo de bóson de Higgs!

Como o peso é igual ao produto da massa pela intensidade do campo gravitacional, sem massa o peso da pedra foi anulado.

A menina estava transportando um objeto que teria 30 toneladas, mas que sem a partícula de Deus ficou sem massa e portanto sem peso. Na verdade a menina erguia somente o filme do envólucro de 200, talvez 300 gramas.

Que sonho elucidativo! Pensei em perguntar como eles retiravam a partícula de Deus do embrulho plástico.

Perguntei, um druida simpático começou a explicar, mas não consegui entender nada, Romeu Féres havia voltado à carga, desta vez com sotaque de Vicente Celestino. Ou seria Lady Gaga?

Acordei!

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