Opinião

O consumo continua forte

O Estado de S.Paulo - Editorial
Sustentado pelo aumento do emprego, pelos ganhos salariais e pela expansão do crédito, o consumo privado continuou crescendo mais que a oferta interna de bens e serviços no segundo trimestre, quando o Produto Interno Bruto (PIB) foi 0,8% maior que no primeiro, segundo o IBGE. No trimestre anterior, a economia havia crescido 1,2%.

Entre abril e junho o consumo privado foi 1% maior que nos três meses anteriores e 5,5% superior ao de um ano antes. A expansão trimestral foi a 31.ª consecutiva. O descompasso entre a demanda dos consumidores e a oferta interna explica em boa parte a vigorosa e prolongada alta de preços, interrompida brevemente no meio do ano e agora retomada, como confirmam os últimos dados de inflação.

Também o consumo do governo - o custo dos serviços prestados pelas administrações federal, estadual e municipal - continuou em expansão, com aumento de 1,2% entre o primeiro trimestre e o segundo.

Quando se examinam os novos dados gerais da economia brasileira, fica evidente, mais uma vez, a precipitação do Banco Central (BC) ao decidir o corte dos juros básicos. O esfriamento econômico, alegado pelo governo e pelo BC para justificar essa decisão, é apenas parcial. É muito mais sensível do lado da oferta interna de bens e serviços. O cenário é diferente do lado da demanda. O crescimento do consumo familiar foi maior no segundo trimestre do que no primeiro, quando havia ficado em 0,7%. E continua vigoroso, como indica, por exemplo, o número de veículos emplacados em agosto, 6,9% maior que o de julho e 4,7% maior que o de um ano antes.

Novos ganhos para os trabalhadores devem ocorrer no segundo semestre e já está garantido um aumento de 13,6% para o salário mínimo. Somados esses fatores a um orçamento expansionista para 2012, ano de eleições, como se pode apostar num arrefecimento da inflação? O próprio governo embutiu na proposta orçamentária uma previsão de crescimento econômico de 5%. A estimativa oficial para 2011 está em torno de 4%. O mercado prevê menos que 4%.

O investimento em máquinas, equipamentos, imóveis e infraestrutura, no segundo trimestre, foi 1,7% maior que no primeiro. Essa expansão dependeu, em parte, da importação de bens de capital. O aumento das compras externas foi impulsionado tanto pelo consumo quanto pelo investimento. Do primeiro para o segundo trimestre a produção industrial avançou 0,2%, mas esse resultado ligeiramente positivo dependeu essencialmente das atividades extrativas. A indústria de transformação, segundo o IBGE, ficou estagnada.

Esses dados da produção fabril podem até parecer muito pessimistas. De toda forma, as informações parciais disponíveis até agora apontaram uma desaceleração. A perda de impulso resultou principalmente das condições de competitividade da indústria brasileira, prejudicada pela valorização do real - seus produtos ficaram mais caros que os estrangeiros. O câmbio muito valorizado se somou a outras desvantagens bem conhecidas e genericamente descritas como "custo Brasil".

A redução dos juros básicos, neste momento, não resolverá nenhum desses problemas. O problema da indústria não está no lado da demanda, mas na formação de custos, por causa de fatores como o excesso de impostos, as deficiências da infraestrutura e o alto preço da energia. Se a demanda interna crescer com mais vigor, pressionará mais fortemente os preços e exigirá mais importações, oferecendo um mercado mais amplo aos produtores de fora.

Juros básicos menores não tornarão muito mais fácil o investimento industrial, até porque a maior parte do financiamento de longo prazo é concedida em condições melhores que as do mercado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A criação de um mercado para títulos de longo prazo depende de vários outros fatores, incluída uma gestão austera e mais equilibrada das contas públicas.

Por enquanto, só diretores do BC parecem acreditar nas promessas de austeridade. Até pagaram adiantado, cortando os juros antes da prometida contenção de gastos.

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